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11/11/2005

Por uma ciência mais humana

Adriana Melo






Ciência e Humanidade foram os temas centrais da 9a Jornada Científica de Pós-Graduação e da 13a Reunião Anual de Iniciação Científica da Fundação Oswaldo Cruz, que foram debatidos nesta segunda-feira (07/11) em mesa-redonda no auditório da Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp). Participaram a arqueóloga Niède Guidon, presidente da Fundação Museus do Homem Americano (Fumdham), o antropólogo Gersem Baníwa, da Universidade de Brasília, o neurocientista Ivan Izquierdo, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, e o jornalista e escritor Fausto Wolff. A conversa foi mediada pela vice-presidente de Ensino, Informação e Comunicação da Fiocruz, Maria do Carmo Leal.


Desde 1973 Guidon estuda as pinturas rupestres do Parque Nacional da Serra da Capivara, no Piauí, para descobrir como viviam os autores dos desenhos encontrados nas cavernas da região - das ferramentas que usavam às doenças que os acometiam. Observando a maior concentração desse tipo de pintura no mundo, a arqueóloga traça um perfil da evolução da arte brasileira na pré-história. Até agora, dos diferentes pigmentos aos métodos para lascar e polir as pedras, passando pelo desenvolvimento de cerâmicas, os achados demonstram que "esses homens sabiam o que queriam e como obter o que queriam", orgulha-se a especialista.


Uma possível justificativa para tal tecnologia, considerada avançada para a época, era a localização da comunidade: o limite entre dois dos ecossistemas mais ricos do país, a floresta amazônica e a Mata Atlântica. "A riqueza da natureza é refletida na riqueza cultural dos povos que vivem em contato com ela", explica. Guidon lamenta que, apesar do passado rico, o estado do Piauí seja, hoje, o mais pobre do Brasil. "Nos ossos antigos não há sinal de desnutrição, problema que hoje assola a região", conta. "A ocupação do Piauí pelos colonizadores foi tardia, por volta de 1750, e brutal, com a exterminação dos índios. Até hoje, a população da região não é capaz de reconhecer a importância da cultura que lá existia".


Problema semelhante é enfrentado por Gersem, líder do povo baníwa, habitante da região do Alto Rio Negro, na fronteira entre Brasil, Colômbia e Venezuela. Vivendo entre a cultura indígena, na qual foi criado, e a cultura branca, na qual foi inserido ao entrar para a universidade, o professor enfrenta um permanente conflito: "a lógica da academia e a lógica dos povos indígenas são completamente diferentes, apesar de não serem antagônicas", explica. "Meu propósito é aproximar as duas para possibilitar um diálogo, mas não tem sido fácil".


Um exemplo claro de choque entre as duas culturas é o tratamento de doenças: pajés e médicos são especialistas - cada qual segundo a sua tradição -, mas acreditar no conhecimento de um parece ser o mesmo que desacreditar o conhecimento do outro. No entanto, as tuas tradições já começam a dar alguns passos para a aproximação. "Isso seria impensável antigamente, mas hoje, no hospital de São Gabriel da Cachoeira, município próximo à aldeia, dois pajés dão consulta junto com os médicos", comemora Gersem. "Tem que haver um equilíbrio. Os conhecimentos dos índios podem contribuir para aumentar o conhecimento humano de um modo geral".


Por fim, Izquierdo, mundialmente reconhecido pelos seus estudos sobre os mecanismos da memória humana, explicou como esquecemos a maioria das coisas que aprendemos ou vivemos e que os mecanismos de memória se saturam, de modo que temos dificuldade de aprender muitas coisas diferentes em um curto espaço de tempo. Wolff, por sua vez, dissertou sobre a importância que a universidade tem na formação de seres humanos melhores e mais conscientes.




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