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04/09/2023

Projeto mapeia pré-vestibulares populares do Rio de Janeiro

Luiza Toschi e Nathalia Mendonça (Cooperação Social da Fiocruz)


Agora é possível, em um mapa como aqueles usados em aplicativos de celular, encontrar facilmente um local de educação popular para estudar para o vestibular que está chegando - ou mesmo se cadastrar para dar aulas. O Mapeamento dos Pré-vestibulares Populares da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, disponível na plataforma Vicon Saga, foi realizado pelo projeto Tecendo Diálogos e produzindo conhecimento: juventude, favela, promoção da saúde e educação superior. No site, é possível visualizar endereço, informações de contato e disciplinas oferecidas por locais na Região Metropolitana do Estado do Rio de Janeiro.

Projeto reúne 41 bolsistas residentes de favelas e periferias e, majoritariamente, egressos de pré-vestibulares populares, comunitários e sociais (foto: Divulgação)

 

O projeto é coordenado por um Comitê Gestor com representantes do Fórum de Prés-Vestibulares Populares do Rio de Janeiro (FPVP-RJ), o Centro de Estudos e Ações Solidárias da Maré (Ceasm), o Museu da Maré, a Rede de Empreendimentos Sociais para o Desenvolvimento Socialmente Justo, Democrático e Sustentável (RedeCCAP), o Conselho Comunitário de Manguinhos, a Pró-Reitoria de Extensão da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a Cooperação Social da Presidência da Fiocruz e o Museu da Vida Fiocruz. Além do Comitê Gestor, o projeto conta com a parceira do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnológica em Saúde (Icict/Fiocruz), reúne 41 bolsistas residentes de favelas e periferias e, majoritariamente, egressos de pré-vestibulares populares, comunitários e sociais. 

“Como muitos desses pré-vestibulares não tem recursos para investir em divulgação de suas ações, acabam ficando conhecidos apenas no entorno ou por quem atua na militância da educação popular”, explica a militante do Vila Isabel Vestibulares (Vive), no Morro dos Macacos e integrante da coordenação do projeto Tecendo Diálogos, Taisa Falcão. “Esses espaços não são apenas uma plataforma de acesso à universidade, mas pólos de engajamento da juventude favelada e periférica com os movimentos sociais”, explicou a historiadora.

Arthur Carrica, trabalhador que atua na portaria no Icict/ Fiocruz, conheceu seu atual pré-vestibular pela plataforma. “O pré que eu escolhi não tinha vaga, mas encontrei fácil esse que é perto do trabalho. Agora estou animado para tirar as minhas dúvidas e direcionar meus estudos”, explica ele, que pretende cursar Letras ou Educação Física.

Pesquisa 

Entre fevereiro de 2021 e fevereiro de 2023, os pesquisadores de campo, mesmo com os desafios impostos pelo isolamento decorrente da pandemia da Covid-19, localizaram e conseguiram contato 301 pré-vestibulares populares da Região Metropolitana do Rio de Janeiro. Dos 301 pré-vestibulares detectados pela pesquisa, uma parte foi forçada a fechar em função da pandemia de Covid-19, ao mesmo tempo em que a comunicação com outra parte foi muito prejudicada por conta do contexto pandêmico. Ainda assim, 130 pré-vestibulares populares se disponibilizaram a participar do mapeamento socioeconômico realizado pelos pesquisadores do projeto Tecendo Diálogos.

“Valorizamos cada pontinho desse mapa porque sabemos a dificuldade que foi se manter com a Covid. Quem ficou fortalece muito seus territórios”, diz Anna Carolina Santos, assistente de pesquisa do projeto Tecendo Diálogos, educadora popular do pré-vestibular social do Sindicato dos Trabalhadores das Universidades Públicas Estaduais no Estado do Rio de Janeiro (Sintuperj) e graduanda de geografia pela Uerj.

Os 130 pré-vestibulares responderam a um questionário socioeconômico com mais de 40 perguntas que também estão disponíveis na plataforma e foram sistematizadas pelo projeto. Para Taisa Falcão, esses dados ajudam a compreender quais estratégias públicas são mais importantes para essas iniciativas. “Desejamos pautar políticas públicas de fomento, para que os prés possam melhorar suas estruturas e possam promover a educação popular de forma mais inclusiva, equitativa em ambientes mais saudáveis e sustentáveis”, afirma.

Análise dos resultados

Matemática, Redação e Biologia são as disciplinas mais oferecidas. Já História da África, Inglês e Espanhol são as menos disponibilizadas. 84% dos prés funcionam em espaços cedidos, revelando ameaça à autonomia e à permanência nos seus locais de atuação. Mais de um terço deles recebem apoio também financeiro de instituições religiosas ou precisam fazer eventos e vaquinhas para captação de recursos. Cerca de 21% cobram um valor mensal das estudantes. 

A maior parte dos prés que responderam ao questionário dispõem de aparelhos de ar-condicionado, banheiro, bebedouro e cadeiras e mesas escolares. No entanto, menos de 60 deles possuem apenas um espaço reservado exclusivamente para as aulas (54) e um quadro branco (56), por exemplo. 

Sobre o recorte racial dos pré-vestibulares mapeados, a maior parte do corpo docente e discente se considera preta. Destaca-se que mais de 98% das pessoas que assistem as aulas são pretas (62,62%) e pardas (35,51%). Já o perfil do corpo docente muda um pouco: cerca de 33% se declaram pretos; pouco mais de 34% são pardos; aproximadamente 30% de brancos; e quase 2% são indígenas. O racismo é tema de atividades e debates em 80% dos prés. Enquanto 67% dialogam sobre questões de gênero e diversidade sexual.

O questionário também investigou o nível de articulação dos pré-vestibulares para promoção da saúde e parcerias com equipamentos públicos: são 53 articulados com o setor da educação; 33 com a assistência social; e 26 com a saúde, sendo um pré funcionando na EPSJV/Fiocruz. Ainda que as parcerias com as unidades de saúde de referência não sejam volumosas, quase 70% dos prés dizem desenvolver atividades voltadas para a promoção da saúde mental, como palestras, núcleo de apoio permanente e materiais informativos. 

Geotecnologias como ferramenta de apoio

O Mapeamento dos Pré-vestibulares Populares da Região Metropolitana do Rio de Janeiro está hospedado na plataforma Vicon – Vigilância e Controle, uma iniciativa nacional e livre de custos, desenvolvida pelo Laboratório de Geoprocessamento da Universidade Federal do Rio de Janeiro (LAGEOP/UFRJ) em parceria com o Laboratório de Geoprocessamento Aplicado da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro. Anselmo Rocha Romão, mestre em Saúde Pública pela Escola de Saúde Pública Sergio Arouca (Ensp/Fiocruz) e integrante da equipe do Laboratório de Informação em Saúde (LIS) do Icict/Fiocruz, apoiou o cadastro dos dados na plataforma e reforçou o valor da disseminação das informações da pesquisa:

“O Vicon Saga vem de vigilância e controle. Não uma vigilância coercitiva, mas no sentido de transformar a sociedade no processo de inclusão das pessoas. Vigiar o que é injusto e criar justiça social”, explicou Anselmo. “Ressalto a qualidade de produção de conhecimento pelos movimentos populares e grupos no território”, valorizou Pricila Magalhães, PR5/Ufrj, sobre a atuação do projeto.

Tecendo Diálogos

Com o objetivo de valorizar a educação superior e reforçar o campo da promoção da saúde a partir de ações coordenadas entre os pré-vestibulares populares ou comunitários, as universidades públicas, a Fiocruz e os movimentos sociais organizados, o projeto aposta na juventude organizada para fortalecer o diálogo e a produção de conhecimento e ação política, no âmbito da promoção da saúde, da educação superior, da ciência cidadã e da participação social. Seus grupos de trabalho são: Mapeamento dos Pré-vestibulares Populares do Rio de Janeiro; Jornada Científica Favelades Universitáries; Levantamento Bibliográfico Maré/Manguinhos; Lutas e Letras; Trajetórias; e o GT de Saúde Mental e Integral. 

O mapeamento de pré-vestibulares populares da Região Metropolitana do Rio de Janeiro é uma das ações desenvolvidas pelo Tecendo Diálogos, em parceria com o Fórum Favela Universidade (FFU) e o Fórum de Pré-vestibulares Populares do Rio de Janeiro (FPVP-RJ). O projeto também apoia as atividades pedagógicas dos dois Fóruns, que articularam junto ao mandato da Deputada Estadual Dani Monteiro a Lei Estadual 9548/22, que institui o Programa Estadual de Incentivo aos Cursos Sociais, Populares e Comunitários nas Escolas.

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