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30/11/2007

Projeto melhora a vida da população de comunidades de Campos dos Goytacazes

Marcelo Garcia


O programa Parasitoses do Norte Fluminense, desenvolvido pelo Instituto Oswaldo Cruz (IOC) da Fiocruz em parceria com a Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf) e a Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), está melhorando a qualidade de vida da população de uma comunidade carente do distrito de Travessão, em Campos dos Goytacazes, no norte do Estado do Rio de Janeiro. Um dos trabalhos pertencentes ao programa, que foi premiado com menção honrosa na categoria pôster no 20º Congresso Brasileiro de Parasitologia, promovido no Recife entre 28 de outubro e 1º de novembro, avaliou a prevalência de parasitoses intestinais entre moradores da comunidade, buscando promover a educação da população para a prevenção destas doenças.


 Os moradores da comunidade de Parque Santuário não tinham acesso à rede de esgoto e consumiam água extraída de poços rasos, 100% imprópria para o consumo, segundo o estudo (Fotos: Leceg/IOC) 

Os moradores da comunidade de Parque Santuário não tinham acesso à rede de esgoto e consumiam água extraída de poços rasos, 100% imprópria para o consumo, segundo o estudo (Fotos: Leceg/IOC) 


O projeto teve início em 2003, quando assistentes sociais e representantes da Pastoral da Criança de Travessão procuraram o pesquisador Antonio Henrique Almeida de Moraes Neto, do Laboratório de Ecoepidemiologia e Controle da Esquistossomose e Geohelmintoses (Leceg) do IOC, e professores da Uenf para orientar a população da comunidade de Parque Santuário, frente às péssimas condições de saúde da região. “Trata-se de uma área muito pobre, sem saneamento ou abastecimento de água tratada, esgoto a céu aberto e muito lixo”, explica o pesquisador. Foi, então, criado o projeto que, em seu primeiro ano, estudou a qualidade da água consumida pelos moradores da região. Os resultados encontrados foram alarmantes: “Os moradores utilizavam água proveniente de poços rasos em suas casas”, conta o pesquisador . “Nós observamos, após as análises, que a água estava 100% imprópria para consumo em todas as residências da comunidade”.


No ano seguinte, em 2004, foram feitos estudos com a população local, por meio da aplicação de questionários nas residências, para verificar o que essas pessoas conheciam e quais eram suas percepções sobre as parasitoses intestinais. “Constatamos que havia falta de conhecimento sobre o tema”, explica Antonio Henrique, que hoje é coordenador do Parasitoses. “Muitos moradores associavam a presença das verminoses com o consumo de doces e acreditavam que em agosto não se podia tomar remédios para verminoses, por ser o mês da revolta dos vermes”.

 

Os indivíduos cadastrados foram encaminhados ao Hospital de Travessão a fim de serem examinados clinicamente e realizar exames parasitológicos de fezes, para verificar a prevalência de parasitoses.  “Constatamos que cerca de 50% da população estava infectada”, conta o pesquisador. “As crianças eram as mais afetadas, correspondendo a 67% do total.” Os parasitas mais freqüentes eram o helminto Ascaris lumbricoides e os protozoários Giardia lamblia e Entamoeba histolytica, que podem causar doenças como ascaridíase, giardíase e amebíase no homem, respectivamente. Com base no resultados dos exames e na análise das respostas dos questionários, foi feito um trabalho de educação em saúde com a população. Os moradores receberam esclarecimentos através de palestras, além de uma cartilha com medidas de prevenção das parasitoses. “Os moradores da comunidade trabalham, em sua maioria, na lavoura de cana-de-açúcar e são muito pobres, não têm como comprar filtros e nem mesmo gás para ferver a água antes de beber, por isso, recomendamos a cloração da água, para prevenir a contaminação”, conta Antonio Henrique.


 Os pesquisadores constataram que a população tinha pouca informação sobre parasitoses e acreditava em mitos como a de estarem ligadas diretamente ao consumo de doces ou café em demasia e à fase da lua

Os pesquisadores constataram que a população tinha pouca informação sobre parasitoses e acreditava em mitos como a de estarem ligadas diretamente ao consumo de doces ou café em demasia e à fase da lua


Uma nova análise, no início do ano de 2005, mostrou uma redução na prevalência de parasitoses intestinais na população. “Essa redução tem a ver, é claro, com o tratamento”, analisa Antonio Henrique, “mas acreditamos que seja resultado, também, de uma maior conscientização da população, pois percebemos que os moradores já estavam mais bem informados sobre o tema.”

 

O trabalho foi ampliado para outra comunidade da região, o Arraial. “Apesar de ter uma estrutura um pouco melhor que a outra comunidade, encontramos o mesmo nível de contaminação e desinformação da população”, o pesquisador descreve. Atualmente, o programa atende 300 famílias, no total. “Já em 2008 pretendemos aumentar a amostra”, prevê.


No início de 2007 foi feito um curso de capacitação que contou com estudantes da Uenf, professores do ensino público e privado, agentes comunitários da Secretaria de Saúde de Campos e pessoas das comunidades. “Esse é um trabalho que não deve parar e o objetivo é que ele se torne auto-sustentável", acredita Antonio Henrique. “Se nos limitarmos ao tratamento, em seis meses estarão todos contaminados novamente”.


O IOC também está iniciando um projeto sobre helmintoses nas escolas municipais da região, coordenado pela pesquisadora Tereza Favre, chefe do Laboratório de Ecoepidemiologia e Controle da Esquistossomose e Geohelmintoses do Instituto. “A partir destes projetos incluímos o município de Campos no mutirão contra as verminoses”, afirma Antonio Henrique. “Também estamos em sintonia com as prioridades do Ministério da Saúde e da Assembléia Mundial da Saúde, cujas metas são trazer o SUS e o Programa Saúde da Família para as escolas e desverminar a maioria das crianças até 2010”.

 

O Programa Parasitoses do Norte Fluminense é composto por outros projetos, dedicados a diversos problemas de saúde da região, como doenças sexualmente transmissíveis (DST) e Aids, piolho, sarna, alergias, zoonoses e nutrição. “Todos esses projetos têm como objetivo orientar a população e promover a educação para a saúde”, afirma Antonio Henrique. A repercussão do Programa foi tão boa que agora ele recebe o apoio da Prefeitura municipal (Secretarias de Saúde e de Educação) e dos hospitais da região. Conta com profissionais de diversas formações provenientes do IOC, da Uenf e da Uerj. Além disso, serviu de base para monografias, para um projeto de mestrado e obteve apoio da Faperj, em edital recente. Mas, segundo Antonio Henrique, a maior vitória é o retorno que o trabalho está dando para a comunidade. “Um programa como esse, além de ser uma pesquisa acadêmica sobre epidemiologia, pode melhorar a vida dessas pessoas. “É a academia ultrapassando seus muros”, acredita. “É com isso que fico realmente feliz, porque é através de projetos como este, que podemos nos sentir realmente úteis à sociedade".

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