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08/04/2010

Projeto vai ampliar pesquisa sobre câncer de colo uterino

Informe Ensp


O câncer de colo de útero é a primeira causa de câncer em mulheres nos países em desenvolvimento. Em 2010, espera-se a ocorrência de mais de 18 mil novos casos no Brasil. No Rio de Janeiro, as estimativas do Instituto Nacional do Câncer (Inca) revelam que em torno de 23 mulheres, de cada 100 mil, venham a adoecer anualmente por esse tipo de câncer. Para ampliar a compreensão sobre as causas e mecanismos associados ao processo de enfrentamento da doença vivenciado por mulheres, está sendo realizada, na Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), a pesquisa Qualidade de vida subsequente ao tratamento do câncer de colo uterino, agora contemplada no Programa de Apoio à Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação em Saúde Pública (Inova-Ensp). Vale lembrar que o câncer de colo de útero é facilmente detectado por meio do exame citológico Papanicolau.


 Rosalina Koifman e Cristiane Novaes, que estão à frente do projeto

Rosalina Koifman e Cristiane Novaes, que estão à frente do projeto


O estudo, coordenado pela pesquisadora Rosalina Koifman, do Programa de Pós-Graduação em Saúde Pública e Meio Ambiente, começou a ser desenvolvido com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e agora foi contemplado no Inova-Ensp para o período de 2010-2013. Rosalina destaca que esse tipo de câncer tem cura quando descoberto na fase inicial, período em que a sobrevida é de 100%. "O Rio de Janeiro apresenta um número considerável de casos. Somente na unidade do Inca, voltada especificamente para o tratamento de câncer de colo uterino, foram registrados 696 casos novos em 2009, não contando os casos registrados em clínicas particulares e outros hospitais", diz.


No estudo desenvolvido pela pesquisadora, já estão sendo acompanhadas cerca de 300 mulheres, com menos de 65 anos, que apresentam estágio intermediário da doença e fazem acompanhamento no Inca. Essas mulheres são avaliadas em três diferentes momentos: inicialmente no diagnóstico da doença, seis meses após o término do tratamento e um ano após sua conclusão. Assim, a investigação pretende traçar uma descrição dos efeitos adversos decorrentes do tratamento do câncer de colo uterino, avaliar sua qualidade de vida subsequente ao tratamento e estimar a prevalência de distúrbios decorrentes dos efeitos tardios da radioterapia, incluindo a disfunção sexual.


Para isso, foram desenvolvidos questionários específicos para as participantes do estudo, que vêm sendo aplicados nas três etapas da pesquisa. "Com a inserção do projeto no edital Inova-Ensp, poderemos aumentar o período de acompanhamento das mulheres, ampliar o quantitativo de participantes na pesquisa, incluir a análise dos relatos de seus companheiros (muitas pacientes são abandonadas ao longo do tratamento), bem como realizar um estudo qualitativo a partir do relato dessas mulheres", aponta Rosalina.


A sobrevida varia muito de acordo com o estágio em que o câncer é detectado. "Muitos casos em etapa intermediária de evolução da doença, que são o foco desse estudo, já chegam até nós com sintomas antigos, como, por exemplo, sangramento e dor, que, em muitos casos, não é visto como um problema pelas mulheres. "O sangramento é algo que a mulher está habituada a ter, pois convive mensalmente com a menstruação, e, por isso, não se preocupa em apresentar sangramento por período mais prolongado do que o habitual, ou mais de uma vez ao mês", explica Cristiane de Oliveira Novaes, doutora pelo Programa de Pós-Graduação Saúde Pública e Meio Ambiente e bolsista do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).


"Existem casos de mulheres de menos de 30 anos que já apresentam níveis intermediários e avançados da doença e estão sujeitas a efeitos tardios, que levarão para o resto da vida. Um deles é a infertilidade, que acontece em quase 100% dos casos, pois a radiação alcança os ovários, afetando os óvulos, e a maioria das mulheres realiza a retirada cirúrgica do útero. Outro problema que pode ser apresentado por essas pacientes é a disfunção sexual, pois o tratamento afeta os sistemas digestivo, reprodutivo e urinário, apresentando sequelas na vagina, vulva, ovários, pele e, menos frequentemente, nos ossos e nas células da corrente sanguínea. Esses efeitos prejudicam a qualidade de vida das mulheres e podem conduzir ao aumento de seu sofrimento. Muitas delas já chegam para o tratamento deprimidas, ansiosas, como se já houvesse uma sentença prescrita para elas. Adicionalmente, nem sempre existe um suporte social adequado, e muitas vezes quando existe um parceiro, ele não compreende a extensão da doença nem suas implicações na autoimagem e autoestima da mulher", comenta Cristiane.


Rosalina aponta que o diagnóstico de câncer uterino pode resultar numa mudança de vida da paciente, pois não afeta somente sua natureza física, mas também emocional e existencial. A autoestima costuma ficar abalada e dificilmente recupera as condições de vida prévias à descoberta do câncer. A vida diária, e também a de seu parceiro, são igualmente afetadas em relação ao trabalho, relacionamento, vida social e sexual. "A literatura científica sugere que a sexualidade é a área mais afetada entre as mulheres com câncer, mas existem poucas investigações para examinar o papel da sexualidade no processo de enfrentamento da doença. O tratamento com a cirurgia e a radioterapia pode induzir ao estreitamento e à secura vaginal, conduzindo à diminuição na frequência das relações sexuais. Além disso, a mulher fica com receio de ter relações e sentir dor ou ter novas hemorragias mesmo após o tratamento".


Nessa investigação, é feito um acompanhamento das mulheres ao longo do tempo, buscando-se documentar as intercorrências surgidas no período pós-tratamento. "Normalmente, o tratamento dura quatro meses, mas pode variar de uma paciente para outra. Na pesquisa, os efeitos são medidos 90 dias após o termino do tratamento. Ao seu término, pretende-se determinar o padrão de incidência de efeitos tardios selecionados, como inflamações, cistite, fístula reto-vaginal e disfunção sexual, decorrentes da exposição à radioterapia nas pacientes, bem como avaliar o papel das modificações na sexualidade sobre a qualidade de vida após a realização da radioterapia".


Esse estudo representa um avanço ao enfatizar um aspecto pouco privilegiado como é a qualidade de vida, ultrapassando a visão médico-assistencial que privilegia basicamente a cura. Mais do que salvar a vida ou curar a mulher, é necessário criar mecanismos e estratégias para que essa vida tenha mais qualidade e satisfação pós-tratamento. Isso só será possível de atingir se conhecermos esses processos que extrapolam o tratamento e o bem-estar físico. Ou seja, avaliar e acompanhar essa paciente periodicamente, incorporando sua dimensão psicológica, social e acima de tudo feminina, bem como suas experiências ao longo da doença/tratamento. Essas informações darão subsídios à elaboração de estratégias para minimizar o desconforto, o sofrimento e as perdas decorrentes do câncer de colo uterino.


Publicado em 7/4/2010.

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