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03/04/2019

Radis destaca demarcação de terras indígenas no Brasil

Informe Ensp


“Nossos antigos guerreiros usavam arco e flecha; hoje nós usamos a caneta”, declarou a primeira mulher indígena a ser eleita deputada federal no Brasil, Joênia Batista de Carvalho, em entrevista à Radis n° 199, que já está disponível online. “Dizer que a saúde indígena é responsabilidade ou problema de ONGs e usar os recursos da saúde indígena nos municípios é uma irresponsabilidade”, disse ao editor Adriano de Lavor. Joênia foi eleita com 8.267 votos que recebeu no pleito de 2018 por Roraima. Advogada de 45 anos, natural do povo Wapichana, ela também foi a primeira mulher indígena a se formar em Direito no país pela Universidade Federal de Roraima, em 1997, e depois a se tornar mestra pela Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, em 2011. 

De acordo com a Radis, em 2004, Joêmia foi novamente a primeira a ir até a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em Washington, para denunciar violações do Estado brasileiro contra os povos indígenas; em 2008, a primeira a defender um caso no Supremo Tribunal Federal, quando se destacou pelo discurso histórico que proferiu em favor da demarcação da reserva Raposa Terra do Sol. 

Tantas atividades renderam à indígena reconhecimento internacional. Em 2018, Joêmia recebeu o prêmio de Direitos Humanos da ONU, considerado uma espécie de Nobel da Paz concedido pelas Nações Unidas, honraria também concedida a nomes como Martin Luther King, Nelson Mandela e Malala Yousafzai.

Para ela, as mudanças propostas para a Funai na vida dos povos indígenas representam um retrocesso para as políticas públicas e para os direitos indígenas. “A gente sabe que a Funai foi criada no sentido de avançar no reconhecimento, na identificação e demarcação das terras, e para proteger os direitos dos povos indígenas. Um órgão específico, com qualificação técnica, dentro de um sistema governamental, que pudesse garantir essas políticas.” A deputada salientou que, ao invés de avançar na política de regularização das terras, pode ter o retrocesso, a paralisação e a inversão dos direitos. 

Quanto às mudanças propostas para a Saúde Indígena, ela considera que “ameaçar os preceitos constitucionais, como dizer que os indígenas devem ser integrados à sociedade não-indígena para poder exercer seus direitos, no sentido de achar que a demarcação de terras indígenas não é um direito, mas pode ser flexibilizada ou relativizada, coloca em risco não somente a questão das terras, mas também a garantia dos direitos sociais relacionados à terra”.

“A saúde é um efeito disso”. Segundo Joêmia, houve avanço com as políticas de tratamento diferenciado, relacionado à saúde indígena, e se avançou muito ao se criar a própria Sesai (Secretaria Especial de Saúde Indígena), conquistada depois de muito tempo lutando por tratamento diferenciado. Ela lembrou que a saúde era tratada pela Funai, quando se viu que era preciso criar um sistema próprio, dentro do Sistema Único de Saúde (SUS), e a sua criação garantiu muitos avanços nessa área. “A gente vê agora o novo governo discutir mais uma vez essa questão, nós já passamos por isso em outros momentos. Dizer que a saúde indígena é responsabilidade ou problema de ONGs e usar os recursos da saúde indígena nos municípios é uma irresponsabilidade.”
 
A Lei 9.836/1999 criou o Subsistema de Atenção à Saúde Indígena, com o objetivo de estabelecer uma rede de serviços implantada nas terras indígenas, a partir de critérios geográficos, demográficos e culturais. Seguindo os princípios do SUS, esse subsistema considera a participação indígena como uma premissa fundamental para o melhor controle e planejamento dos serviços, bem como uma forma de reforçar a autodeterminação desses povos. Para gerir a política nacional de saúde indígena e a gestão do sistema, foi criada em 2010 a Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai), no Ministério da Saúde, atendendo a reivindicações dos próprios indígenas durante as Conferências Nacionais de Saúde Indígena. A Sesai implementou um novo modelo de gestão e de atenção descentralizado, com autonomia administrativa, orçamentária, financeira e de responsabilidade sanitária em 34 Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs). 

O atual ministro da Saúde, Luiz Henrique Mandetta, anunciou que avalia promover uma mudança na organização da saúde indígena, quando participou de reunião Ordinária do Conselho Nacional de Saúde (CNS), em fevereiro. O Ministro propõe repassar a estados e municípios parte do atendimento em saúde indígena, hoje de atribuição do governo federal, revendo convênios da Sesai com ONGs responsáveis por contratar trabalhadores de saúde. Mandetta alega que hoje o custo é alto e falta fiscalização das atividades realizadas pelas organizações. 

Confira a entrevista no site da Radis

Veja também a íntegra da edição de abril da revista

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