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07/11/2007

Saúde defende o uso de animais em pesquisas científicas

Carolina Oliveira Daibert


O Ministério da Saúde (MS) acredita que a Lei 4.685/2007, sancionada pelo prefeito do Rio de Janeiro, Cesar Maia (DEM), pode prejudicar as pesquisas desenvolvidas pelo Instituto Nacional de Câncer (Inca), pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e pela Fiocruz. A lei considera maus-tratos contra os animais alguns procedimentos comuns em pesquisas. O ministro José Gomes Temporão disse nesta terça-feira (6/11), em declaração exclusiva à Agência Fiocruz de Notícias, que "é um gigantesco retrocesso que inviabiliza a produção de pesquisas em vacinas e medicamentos fundamentais para a saúde do povo brasileiro. Apelo ao presidente da Câmara que coloque imediatamente em pauta o projeto de lei do ex-presidente da Fiocruz Sergio Arouca, que trata do uso de animais em pesquisas. Acho muito edificante o amor que o vereador Claudio Cavalcanti e sua esposa Maria Lucia Frotta têm pelos animais - que nós também temos -, mas os profissionais que trabalham na área de saúde e ciência e tecnologia também precisam priorizar o bem-estar do ser humano".


 Temporão: a lei é um gigantesco retrocesso que inviabiliza a produção de pesquisas em vacinas e medicamentos fundamentais para a saúde do povo brasileiro (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr)

Temporão: a lei é um gigantesco retrocesso que inviabiliza a produção de pesquisas em vacinas e medicamentos fundamentais para a saúde do povo brasileiro (Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom/ABr)


“Para reverter essa insensatez é primordial a aprovação do projeto de lei de Arouca, que define regras para a utilização de animais como cobaias em pesquisas científicas”, afirmou o secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Reinaldo Guimarães, em entrevista coletiva concedida em Brasília. Ele explica que é preciso aprovar uma lei federal que se sobreponha à municipal. Para isso, o secretário garantiu que o Ministério da Saúde vai pedir agilidade para a votação do projeto de lei ao presidente da Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP). “O Rio de Janeiro é o segundo centro de pesquisas biomédicas do país. Corresponde a cerca de 20% das pesquisas brasileiras. Com essa lei em vigor, as pesquisas terão que ser interrompidas”, disse o secretário.


Guimarães afirmou que a lei municipal é excessivamente ampla e, publicada desta forma, impede que o Inca,a  UFRJ e a Fiocruz cumpram as suas funções institucionais. Como exemplo, o secretário citou a vacina de febre amarela. Produzido no Rio de Janeiro, o imunobiológico é desenvolvido dentro de um ovo de galinha. Por se tratar de um organismo vivo, a produção da vacina pode ser comprometida com a nova lei. “Caso a proibição seja consolidada, todas as investigações científicas, pré-clínicas, terão que parar. É espantoso que o prefeito tenha sancionado esta lei”, afirmou. Ele acrescentou que Cesar Maia já havia vetado um projeto semelhante, também apresentado pelo vereador Cláudio Cavalcanti (DEM).


O secretário esclareceu que os animais, em sua maioria ratos e camundongos, utilizados em pesquisas são especificamente criados para esta finalidade. Muitos, inclusive, são geneticamente modificados para simular doenças humanas. Ele ressaltou que as investigações pré-clínicas ainda podem ser feitas por computador, como defendem alguns. Segundo Guimarães “ainda não temos tecnologia suficiente para tanto”.


O coordenador da Comissão de Ética no Uso de Animais da Fiocruz, Octavio Presgrave, disse que este também é o desejo da comunidade científica, mas que a proibição trará grandes prejuízos. "Os métodos alternativos ao uso de animais existem, mas abrangem uma minoria das áreas de pesquisa. Uma parte bastante significativa ainda requer o uso de animais, até mesmo porque não há nenhum medicamento que vá para o mercado que não passe por um estudo clínico, que depende de um ensaio pré-clínico, que utiliza animais”, disse. Ele afirmou que pesquisadores da Fiocruz pretendem ir à Câmara Municipal do Rio de Janeiro para conversar com os vereadores sobre como pode ser feita a interpretação da lei.


O membro da Academia Brasileira de Ciencias e pesquisador da Fiocruz Hermann Schatzmayr disse que a prevenção da crueldade com animais é parte da cidadania e o que se faça neste sentido é louvável. Mas ele afirmou que, como está redigido, "o documento inviabiliza em nosso município procedimentos fundamentais para a saúde do homem e dos próprios animais, pois todos os tipos de vacinas, por exemplo, são obrigatoriamente testados em animais de experimentação, seguindo estritos padrões internacionais de ética. Cita-se ainda o diagnóstico de doenças graves como a raiva, que utilizam estes procedimentos, pois está em jogo a saúde de pessoas que precisam com urgencia destes diagnósticos".


O MS espera agora uma avaliação do seu departamento jurídico para saber se a lei municipal vai comprometer as pesquisas em andamento. Nos últimos quatro anos o ministério investiu R$ 100 milhões em instituições de pesquisas do município do Rio de Janeiro. Na próxima terça-feira (13/11), cientistas de todo o país pretendem pedir, em Brasília, agilidade na aprovação do projeto de Arouca, que está na Câmara desde 1995.

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