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20/10/2011

Segundo dia de Conferência é marcado por debates

Claudia Lima, Marina Bittencourt e Filipe Leonel


O segundo dia (20/10) da Conferência Mundial sobre os Determinantes Sociais da Saúde, promovida pela Organização Mundial da Saúde (OMS) no Rio de Janeiro de 19 a 21 de outubro, que reúne autoridades políticas, pesquisadores e representantes de movimentos sociais de mais de 120 países para traçar estratégias e definir metas para a redução das iniquidades em saúde em escala local e global, foi marcado por cinco eixos de debates. São eles: Governança para enfrentar as causas das iniqüidades em saúde: implementando ações sobre os determinantes sociais da saúde, Promovendo a participação: liderança comunitária para ação sobre os determinantes sociais da saúde, O papel do setor Saúde, incluindo os programas de saúde pública, na redução das iniqüidades em saúde, Ação global sobre os determinantes sociais da saúde: alinhando prioridades e parceiros, e Monitorando o progresso: mediação e análise para apoiar políticas sobre os determinantes sociais da saúde.


 Autoridades políticas, pesquisadores e representantes participam de debates na Conferência Mundial sobre Determinantes Sociais da Saúde nesta quinta (20/10). Foto: Peter Ilicciev. 

Autoridades políticas, pesquisadores e representantes participam de debates na Conferência Mundial sobre Determinantes Sociais da Saúde nesta quinta (20/10). Foto: Peter Ilicciev. 





A mesa-redonda Governança para Enfrentar as Causas das Iniqüidades em Saúde, com tema Tornando as Políticas Coerentes em Nível Nacional, na sessão na manhã desta quinta-feira,  foi coordenada pelo ministro de Saúde Pública do Uruguai, Jorge Enrique Venegas. Nela, estavam presentes o ministro da Saúde da Eslovênia, Dorijan Marusic; o ministro da Saúde do Peru, Alberto Tejada Noriega; o vice-ministro da Saúde de Gana, Robert Joseph Mettle-Nunoo; a ministra da Saúde e Serviços de Cuidados da Noruega, Anne-Grete Strom-Erichsen; e o professor da Massey University, da Nova Zelândia, Don Matheson. As apresentações se iniciaram com comentários do ministro Venegas. Ele destacou que o tema da mesa merece mais do que reflexão, mas também a exposição de experiências que sobre governança, assim como discussão  sobre os caminhos que os países formulam para cortar as iniquidades em saúde. Venegas também ressaltou que não se pode esquecer da saúde vista como um direito social.



Em seguida, foi a vez dos convidados da mesa participarem. “Os determinantes sociais são requisitos para a liberdade”, afirmou Don Matheson, na apresentação de sua nota introdutória. O professor ressaltou a importância da boa governabilidade na luta pela equidade em saúde e acrescentou que há vários instrumentos de governança usados pelos países para alavancar os determinantes sociais em saúde, com diferentes resultados. “ Temos que ter a flexibilidade na governança, fazer uma abordagem integral. O Estado deve estar disposto a lidar com as iniquidades e as respostas precisam surgir das oportunidades encontradas no contexto local”, comentou. Matheson ainda apontou que é essencial considerar os valores das diferentes sociedades para planejar ações para a equidade.



Logo após, Alberto Tejada Noriega, ministro de Saúde do Peru, declarou que no novo governo de seu país há o ideal de o crescimento econômico ter de caminhar de mãos dadas com o desenvolvimento social, além de abordar as políticas sociais como um investimento e não como gasto. O ministro anunciou que, seguindo essa linha de pensamento, seria inaugurado, no dia seguinte (21/10), o Ministério de Inclusão Social. Noriega também apontou uma ação do governo com resultados promissores no combate à tuberculose – segundo ele, uma doença emblemática da iniquidade. Ele explicou que é uma atividade integrada de seis ministérios (Educação, Trabalho, Justiça, Produção e Desenvolvimento Social conjuntamente com Saúde) que trabalham juntos com um enfoque não medicalizado para tratar da tuberculose. A ação se dá não apenas no âmbito federal, mas também no municipal e em relação a isso o ministro aponta a importância das municipalidades, “que são as que estão em contato direto com as pessoas”.



O vice-ministro da Saúde de Gana comentou que a coerência entre as políticas é outro fator essencial e, para isso, um caminho é o Ministério da Saúde determinar o que é necessário em cada setor para que todos os ministérios possam contribuir da maneira adequada para melhorar a saúde no país. Os debatedores ainda ressaltaram a necessidade da saúde de ser tomada como uma das prioridades do governo e, então, a importância do trabalho inter-setorial para alcançar a meta de diminuir as iniquidades em saúde.


Experiências locais em participação influenciam políticas



A importância da criação de políticas intersetoriais, inovadoras e próximas da população norteou as discussões da mesa da tarde do primeiro eixo da Conferência Mundial sobre Determinantes Sociais da Saúde. No painel Tornando as políticas coerentes em nível subnacional e local, foram apresentadas experiências de participação do Acre e das cidades de Rosário, na Argentina, de Teerã, no Irã, e de Seul, na Coreia do Sul.


Monica Fein, prefeita da cidade de Rosário, na província argentina de Santa Fé, afirmou que a força do governo de sua região está relacionada ao processo de inovação e construção de políticas públicas voltadas para a aproximação da população. Para isso foram criadas instituições que pensam no coletivo da cidade, reforçando a participação do cidadão na resolução de problemas. "Nosso objetivo é tornar o Estado mais próximo do povo, gerando maior participação, equidade, inclusão e descentralização. Um Estado descentralizado e participativo subentende planejamento estratégico e coletivo", disse.


O governador do Acre, Sebastião Afonso Viana Macedo Neves, falou sobre o projeto político de governo desenvolvido em seu estado, que resultou na redução das taxas de analfabetismo (de 25 para 12%), e o alcance da meta do milênio de redução da mortalidade infantil e citou um programa de distribuição de renda como sendo fundamental na redução das desigualdades locais. O governador afirmou que o Acre está totalmente vinculado à estratégia do país, no sentido de exercer a democracia para legitimar políticas públicas. "Democracia e capacidade de ouvir devem estar presentes em toda forma de fazer política. Nosso sistema de saúde é maduro e tem a participação como eixo central. Cabe à sociedade fiscalizar a qualidade da assistência", afirmou.


Irã: conselhos locais são fundamentais na melhoria da saúde da população


Logo em seguida, o diretor do Departamento de Saúde Pública do Sul da Austrália, Kevin Buckett, falou sobre as ações de DSS desenvolvidas na região - elaboradas a partir de um plano estratégico local. "Nossos gastos com saúde estavam aumentando e, de acordo com nossos cálculos, esses gastos consumiriam cerca de 50% dos recursos da nossa região em 10 anos. Portanto, tínhamos que atuar sobre os determinantes sociais da saúde. Esse passou a ser um interesse regional para alcançarmos melhores metas de saúde", admitiu.


Na palestra seguinte, Hyun Kyung Park, presidente da Fundação para a Mulher e a Família de Seul, Coreia do Sul, falou sobre as melhorias na área habitacional da cidade e o investimento para o bom comportamento dos cidadãos como estratégia de promoção da saúde. "Temos um projeto de cidade amigável para promover melhor qualidade de vida para nossa população. Por meio dele buscamos a melhoria de todo o ambiente e da escola. Construímos uma comunidade saudável em nível local", apontou.


O subprefeito de Teerã para assuntos sociais, no Irã, Mohammad Hady Ayazi, deu ênfase às formas de participação da população no governo local. Revelou que sua cidade é habitada por 10 milhões de habitantes, possui mais de 300 bairros, além de uma extrema diversidade cultural. Segundo ele, no Irã existe um ministro responsável pela saúde do povo, mas os conselhos locais são fundamentais na melhoria da saúde da população. "O papel principal do município é de interação entre os diversos setores da sociedade." Ainda de acordo com ele, as consequências da política de equidade urbana possibilitaram a detecção de lacunas. "De acordo com os achados, conseguimos identificar e traçar um perfil de cada comunidade, possibilitando a detecção de problemas e a elaboração de soluções e atuar nos determinantes sociais da saúde."


As ações de saúde cada vez mais devem ser pensadas em sinergia com programas de proteção social



A afirmação do título é da professora do Graduate Institute, da Suíça, Ilona Kickbush, que abriu o painel de discussão O papel do setor da saúde, incluindo os programas de saúde pública, na redução das desigualdades, com tema Assegurando a Cobertura Universal, no segundo dia da Conferência Mundial dos Determinantes Sociais da Saúde. Participaram da discussão a diretora-geral da OMS, Margaret Chan; os ministros da saúde do Reino Unido e do Brasil, Simon Burns e Alexandre Padilha; a presidente da organização não-governamental paquistanesa Heartfile, Sania Nishtar; a professora da Universidad Del Desarrollo do Chile, Janette Vega.


 A professora do Graduate Institute, da Suíça, Ilona Kickbush. Foto: Peter Ilicciev.

 A professora do Graduate Institute, da Suíça, Ilona Kickbush. Foto: Peter Ilicciev.





De acordo com Ilona, 10 a 15% do Produto Interno Bruto da Suíça são gastos pelo setor de saúde, no qual trabalha 10% da população. “Temos que pensar com que noção de justiça queremos trabalhar”, afirmou a professora, ao falar das mudanças necessárias para ampliar o acesso aos serviços de saúde de qualidade. “Precisamos de novas ferramentas, políticas e legais para implementar uma agenda mais ampla de saúde e bem-estar”, afirmou. “Quando discutimos como organizamos nosso sistema de saúde, com acesso universal, falamos sobre que tipo de sociedade nós queremos”, disse.



A moderadora do debate, Janette Vega, perguntou ao ministro Alexandre Padilha sobre o processo de construção do Sistema Único de Saúde, tido como exemplo para muitos países que não contam com sistema de assistência universal. “O contexto histórico-político de redemocratização do país foi decisivo para a opção por um sistema de saúde universal e gratuito. Houve um amplo movimento de mobilização social e política, chamado de reforma sanitária, que legitimou as conquistas de bem estar social”, contextualizou o ministro.



Padilha lembrou crises ocorridas no mesmo período, entre 1986 e 1988, ano da Constituinte brasileira, como a das clínicas privadas de transfusão de sangue. Sem regulação e controle da qualidade sangue, o serviço foi responsável casos de transmissão de doenças infecciosas e do vírus HIV. “A sociedade entendeu que era preciso que o Estado regulasse todas as ações, fluxos e o mercado de saúde para proteger o conjunto da sociedade”, afirmou.


 O ministro da Saúde do Reino Unido, Simon Burns. Foto: Peter Ilicciev. 

O ministro da Saúde do Reino Unido, Simon Burns. Foto: Peter Ilicciev. 





O ministro da Saúde do Reino Unido falou dos desafios enfrentados em seu país, que tem um sistema de saúde universal há 63 anos. “Ter recursos e atendimento gratuito não resulta em zero desigualdade”, afirmou Burns. O ministro disse que há grandes diferenças entre a assistência prestada à população de um bairro rico de Londres e à população da região noroeste do Reino Unido, uma das áreas mais pobres. De acordo com Burns, o governo tem feito esforços para engajar cada vez mais os gestores locais para reduzir as desigualdades no acesso e qualidade do atendimento. “Para o paciente, o importante é o desfecho, é como ele é atendido”, disse.



A médica paquistanesa Sania Nishtar falou das dificuldades de assistência médica em seu país, onde têm direito a atendimento 100 milhões de pessoas com documentação. De acordo com Sania, 80 milhões de habitantes não têm documentos, o que impede seu acesso aos serviços. A médica citou como experiência viável para melhoria da assistência à população a criação de um Fundo de Igualdade, que reunisse recursos para atendimento à população menos favorecida. 


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Saiba mais sobre a Conferência também pelo Portal da Escola de Saúde Pública Joaquim Venâncio da Fiocruz. Clique aqui.  



Publicado em 20/10/2011.

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