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23/11/2010

Seminário da Rede Dengue Fiocruz visa contribuir com a elaboração de estratégias coletivas para o controle da doença

Renata Moehlecke e Ricardo Valverde


Teve início na manhã desta segunda-feira (22/11) o 2° Seminário da Rede Dengue Fiocruz, que ocorre no auditório do Museu da Vida da Fundação. Intitulado Dengue: desafios para políticas integradas de ambiente, atenção e promoção da saúde, o evento, com duração de dois dias, tem como objetivo promover o debate entre gestores governamentais, instituições de pesquisa e a sociedade, visando criar novas estratégias e estimular ações de combate à doença em todo o Brasil. “Para a Fiocruz, a temática é de fundamental importância, pois é um problema de saúde pública com necessidade de enfrentamento multidisciplinar que nos desafia como profissionais há muitos anos”, afirmou o vice-presidente de Ambiente, Atenção e Promoção da Saúde da Fiocruz, Valcler Rangel, na mesa de abertura do seminário. “Temos 71 grandes projetos voltados para o combate da dengue na área de pesquisa, ensino e desenvolvimento tecnológico. O controle da dengue é um assunto complexo e que precisa de contribuições coletivas para ser conquistado”, completou Rangel para uma plateia formada quase que em sua maioria por agentes comunitários de saúde, profissionais que estão na ponta do problema e que têm contato direto com a população, sobretudo a mais pobre.


 Formada por grande número de agentes comunitários de saúde, a plateia pôde tirar dúvidas e saber mais sobre a dengue (Foto: Gutemberg Brito)

Formada por grande número de agentes comunitários de saúde, a plateia pôde tirar dúvidas e saber mais sobre a dengue (Foto: Gutemberg Brito)


Coordenada pelo pesquisador José Augusto Brito, a primeira mesa-redonda do evento abordou a questão Dengue no Brasil: como estamos preparados para seu controle? Perspectivas para ações integradas entre os três níveis de governo. O assessor-técnico da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) do Ministério da Saúde Nélio Batista foi o primeiro palestrante. Ele explicou que o combate da dengue no Brasil deixou de ser isolado e centralizado a menos de uma década e que é preciso acelerar o processo de mudança deste quadro. “Dengue é um problema social da maior gravidade em nosso país, é uma doença que mata”, comentou Batista. “Em 2010, foram 936 mil casos, maior número da série histórica brasileira. Quanto mais sintonizada a participação da população com profissionais de obras e saneamento, quanto maior a qualificação profissional e assistência médica mais estruturada, maiores as chances de controle da doença”.


Também participaram da mesa as pesquisadoras Mary Baran, da Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro, Maria Célia Vasconcellos, do Centro Nacional de Secretarias Municipais de Saúde, e Marília de Abreu, do Conselho Regional de Medicina, como debatedora. “Estávamos despreparados para dengue em 1986, quando ela reapareceu no Brasil, ou em 1991, quando se registrou o primeiro caso de dengue hemorrágica. Hoje, com conhecimento e experiências adquiridos ao longo dos últimos anos, sabemos como devemos atuar, mesmo que o controle do vetor ou mosquito seja complicado”, declarou Baran.


A segunda mesa-redonda, dedicada à temática Rede de ações integradas no controle da dengue, contou com a participação de Joyker Gomes, assessor da Vice-Presidência de Ambiente, Atenção e Promoção de Saúde da Fiocruz, como coordenador, e com as palestras de José Fantine, da Coope/UFRJ, Ana Carolina Rios, da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), e Patrícia Brasil, infectologista do Instituto de Pesquisa Clínica Evandro Chagas (Ipec/Fiocruz). Os participantes abordaram, respectivamente, a questão da criação de uma Rede de Excelência em Dengue, da experiência de mobilização contra a doença na rede de atendimento da saúde privada brasileira e o caso do Pólo Sentinela da Rede Dengue Fiocruz, criado em 2007 com o objetivo contribuir para a vigilância clínica da dengue e com a identificação de sorotipos circulantes no Rio de Janeiro.


Na parte da tarde da segunda-feira, o seminário prosseguiu com o painel Atenção à saúde: atualização das diretrizes clínicas do Ministério da Saúde para a atenção básica e de média-alta complexidade. Participaram a pesquisadora Rita Nogueira, do Laboratório de Flavivírus do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), e as médicas Vanilsa Simion Nascimento, da Secretaria de Saúde do Distrito Federal, e Lucia Rocha, da Prefeitura de Manaus. A também médica Zina Azevedo, do Instituto Fernandes Figueura (IFF/Fiocruz), mediou as apresentações. Rita, a primeira a falar, fez um histórico das epidemias de dengue no município e no estado do Rio de Janeiro e discorreu a respeito da atuação da Fiocruz. Ela detalhou os quatro sorotipos da dengue (1, 2, 3 e 4) e as características de cada um, bem como a entrada deles no país. “Desde o primeiro grande surto recente, verificado em Roraima em 1982, aprendemos muito sobre o mosquito e o vírus. Mas os desafios que temos pela frente ainda são grandes”. Rita também comentou sobre o trabalho e a articulação que existe entre os laboratórios regionais de referência e o nacional, que é o Instituto Evandro Chagas, de Belém. A pesquisadora da Fiocruz também falou sobre a capacitação que tem sido feita em diversos estados, para treinar profissionais que farão os diagnósticos laboratoriais.


A médica Vanilsa Simion, que passou seis anos estudando a dengue em Cuba, esmiuçou o trabalho das 1.564 Equipes de Saúde da Família no Brasil, que proporcionam uma cobertura de 33% da população. São ainda 10.713 agentes comunitários de saúde, o que perfaz uma cobertura nacional de 41%. Vanilsa explicou sobre as formas clínicas da dengue, os sintomas, os sinais de alerta e os protocolos que devem ser seguidos por parte dos profissionais de saúde. Ela também falou sobre a chamada prova do laço, os testes laboratoriais e o tratamento. “Temos que manter a vigilância sempre. Mesmo em Cuba, um país pequeno e onde o sistema de saúde funciona com muita precisão e com o qual podemos aprender muito, volta e meia ocorrem surtos que fogem ao controle”.


A médica Lucia Rocha, que tem coordenado ações contra a dengue em Manaus, disse que “a doença não será erradicada e por isso mesmo temos que estudar, debater, disseminar e divulgar tudo o que sabemos sobre o controle da epidemia”. Para Lucia, é dever do profissional de saúde “impedir o óbito, com treinamento e valorização de equipes, investigação, tratamento adequado, sempre seguindo protocolos válidos e aceitos, falando a mesma linguagem”. Segundo ela, a novidade do próximo verão serão as UPAs, que não existiam na última grande epidemia e que farão a diferença, de forma positiva, quando houver novo surto de dengue.


O assessor-técnico da Secretaria de Vigilância em Saúde (SVS) do Ministério da Saúde Nélio Batista, que já havia apresentado palestra na parte da manhã, voltou a intervir e lembrou do Plano de Contingenciamento para Epidemia de Dengue, que estabelece uma articulação tripartite entre os governos federal, estaduais e municipais. Para Batista, o trabalho ficou muito bem elaborado, mas não pode ser apenas uma bela peça pregada na parede. “Precisa ser posto em prática, por todos os envolvidos no combate à dengue, sem interrupções”.


Na plateia, formada por dezenas de agentes de saúde que atuam em comunidades do Rio de Janeiro, muitos conversavam com colegas sobre os que os palestrantes apresentavam, fazendo correlações com o difícil dia a dia que enfrentam. Para Marcília de Souza, que trabalha na comunidade Vila do João, a oportunidade de ouvir especialistas, poder fazer perguntas e trocar informações com colegas que passam pelo mesmo desafio é enriquecedora. “Tudo o que ouvi e vi aqui será muito importante no meu trabalho, porque precisamos conscientizar a população. É um trabalho de formiguinha, que não termina nunca. E a população volta e meia nos aborda com perguntas que nem sempre conseguimos responder. Em geral somos abordados com perguntas básicas, o que mostra que as pessoas, por mais que a gente trabalhe, nem sempre retêm o que transmitimos. E nós não somos muitos, o número de agentes de saúde deveria ser bem maior... E há momentos em que surgem questionamentos mais complexos. Aí vemos a importância da capacitação. O conteúdo visto aqui nos ajudará”, disse Marcília, que ficou contente com o anúncio de que o futuro site da Rede Dengue em breve tornará disponível todas as apresentações expostas nos dois dias de seminário.


O agente de saúde Pedro Villar dos Santos concorda com Marcília e acrescenta que a capacitação é vital e urgente. “O verão está chegando e ao que tudo indica, pelo que as próprias autoridades de saúde estão informando pelos jornais e pela TV, teremos muitos casos de dengue em 2011. Se estivermos preparados, com a informação adequada e pertinente e com conhecimento do que devemos fazer, para assim orientar bem a população, o quadro poderá ser menos pior do que o previsto. É o que todos esperamos”.


Publicado em 23/11/2010.

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