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21/07/2005

Substância encontrada em sementes de árvores nativas da Ásia tem ação contra o vetor da leishmaniose

Fernanda Marques


Um composto encontrado nas sementes de duas árvores nativas da Ásia impede que as larvas do inseto Lutzomyia longipalpis - principal vetor da leishmaniose visceral no Brasil - completem seu ciclo de desenvolvimento e atinjam a fase adulta. É o que revela uma pesquisa realizada pela bióloga Cláudia Coelho, do Departamento de Entomologia do Instituto Oswaldo Cruz (IOC). A substância - chamada azadiractina - já era conhecida por interromper a metamorfose e inibir a alimentação de outros insetos. Mas esta é a primeira vez que sua ação sobre um vetor da leishmaniose é investigada. Talvez o composto possa ser usado na produção de um repelente contra o inseto.


A azadiractina é retirada das sementes da Azadirack indica e da Melia azedarach. Estas duas árvores já foram introduzidas no Brasil. A primeira pode ser encontrada no Centro-Oeste e a segunda no Sul, onde costuma ser usada na ornamentação de praças e jardins. Existe um exemplar de M. azedarach no campus de Manguinhos da Fiocruz.


As propriedades da azadiractina começaram a ser descobertas na década de 50. Os primeiros registros da ação repelente foram feitos na Índia, onde, certa vez, gafanhotos destruíram completamente uma plantação, deixando intactas apenas as árvores das espécies A. indica e M. azedarach. Hoje, a única empresa que produz azadiractina sintética é a multinacional Sigma.


A larva de L. longipalpis passa por quatro fases de desenvolvimento: ela vai do primeiro ao quarto instar. No laboratório, Cláudia observou que, de 90 larvas alimentadas com a substância sintética, 80% morriam antes de chegar ao terceiro instar. "A metamorfose é interrompida e o inseto não consegue atingir a fase adulta", diz Claudia.


A bióloga também testou folhas e sementes de M. azedarach trituradas contra as larvas do L. longipalpis. Das 90 larvas estudadas, 60% tiveram seu ciclo de desenvolvimento interrompido no segundo instar e, conseqüentemente, não chegaram à fase adulta. "Esses resultados apontam mais uma alternativa no controle do inseto vetor, o que é bem interessante, porque usar a substância sintética tem um custo muito elevado", afirma Cláudia.


Apesar dos resultados animadores, a aplicação da M. azedarach e da A. indica como um bioinseticida alternativo precisa ser avaliada com cautela. Isso porque a azadiractina não é específica para o vetor da leishmaniose: a substância também mata outros insetos. "Por isso, aspergi-la na natureza poderia causar desequilíbrios ecológicos", adverte Cláudia.


A pesquisa da bióloga pretende, portanto, avaliar a utilização da M. azedarach e da A. indica na forma de repelente. O produto seria usado em cachorros - animais reservatórios do parasito causador da leishmaniose visceral - e no próprio homem, para evitar a transmissão da doença. Contudo, ainda não foram feitos estudos de campo.

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