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21/08/2015

Tecnologia a favor da educação é tendência para o futuro, afirma professor da USP

Amanda Sá


Apesar do uso de televisões, projetores e internet em algumas salas de aula como apoio à educação, a resistência à utilização de aparelhos eletrônicos ainda é muito presente nas instituições de ensino brasileiras. Nos últimos anos, diversas leis de proibição ao uso de celulares nas salas de aula foram aprovadas no país. Embora muitos professores possam julgar o uso destes instrumentos como culpados por desviar a atenção dos alunos, o professor de Telemedicina da USP, Chao Lung Wen, afirma que a tendência para o futuro é a invasão da tecnologia no ambiente acadêmico, a fim de estruturar a chamada Educação 3.0.

Em entrevista concedida à Fiocruz, Chao, um dos palestrantes do Seminário Educação, Saúde e Sociedade do Futuro que acontece entre os dias 25 e 27/8 na Fundação, fala sobre a estrutura das salas de aula do futuro, o destino dos livros impressos, o uso das redes sociais e as novas possibilidades de ensino e aprendizagem. 

Como a tecnologia pode ser usada na educação a fim de alcançar melhores resultados na aprendizagem? Existe um limite para essa interação no ambiente acadêmico?

Chao Lung Wen: A tendência para um futuro próximo é a absoluta necessidade de modernização da educação, tornando-a mais interativa, significativa, flexível, contextualizada e adaptável de acordo com os focos de interesses dos estudantes e das necessidades sociais. Poderíamos dizer que o novo método educacional seria designado por Educação Híbrida ou Mista, que possibilitará estruturar a Educação 3.0 ou Educação Interativa Significativa.

Para avançar neste processo de modernização criamos na Disciplina de Telemedicina da FMUSP o Projeto Inovalab (Inovação em Educação) que se fundamenta em quatro pilares principais para a modernização educacional e integrada pela Nuvem do Conhecimento.

Não existe limite para as interações. Elas não podem ser simplesmente caóticas e desorganizadas. Precisam ser orientadas em algum contexto e alinhadas com o propósito formativo, capacitando o indivíduo, gerando confiança e habilitando-o com novas experiências e opiniões.
 
Com a introdução de novas tecnologias de informação e conhecimento como estratégia de ensino, é necessária a capacitação de professores para o manuseio destas ferramentas. Além deste, quais os desafios para a implantação deste processo nas instituições de ensino?

Chao Lung Wen: Como todo processo que envolve mudança é preciso aceitar a necessidade de um planejamento de implantação em múltipla fase, começando pelo convencimento do corpo docente. Poderíamos dividir a modernização nas seguintes fases: (1) – familiarização; (2) incentivo/motivação; (3) qualificação técnico-educacional; (4) envolvimento/ comprometimento. Para a execução das três primeiras fases, é importante estruturar uma boa equipe de apoio para ajudar os professores a potencializar as suas aulas e a darem o primeiro passo. Além da equipe, é necessário envolver a participação dos estudantes para que solicitem e utilizem ativamente todos os conteúdos produzidos para formar um ciclo produtivo positivo de mudanças e melhorias.

O principal desafio da instituição é criar o Plano Orientador de Modernização, formar um Grupo Técnico Executivo Educacional e um Conselho de Educação 3.0. Entre as primeiras etapas, deve-se estruturar uma plataforma com a informatização do Sistema de Avaliação dos Cursos para fins de acompanhamento contínuo das ações, estruturação de um Centro de Produção Digital, aprovação de metas de cumprimento semestral para um plano de 10 anos, formação contínua dos docentes em aplicação eficiente de tecnologias para educação, criação de uma rede de compartilhamento de experiência entre professores, intercâmbio de experiências com outras instituições e adoção de políticas de estímulo à docência com criação de indicadores que possibilitem identificar e premiar os professores de destaques, as boas produções de conteúdos e as inovações em educação (Vertente Educacional).

Como seria a educação apoiada por tecnologia? De que forma isso seria aplicado no cotidiano dos alunos e professores? O uso de livros continuaria mesmo com o suporte da tecnologia ou trata-se de um processo de substituição?

Chao Lung Wen: A educação apoiada em tecnologia é basicamente a incorporação de novos recursos de interatividade proporcionadas pelo avanço da eletrônica e telecomunicação, que permite a expansão da aprendizagem em relação aos métodos convencionais. Por analogia, seria como o avião em relação aos navios e carros. Nunca na história de humanidade foi tão fácil a interação entre as pessoas das diversas partes do mundo e de forma instantânea. Esta facilidade torna possível a aplicação dos conceitos de aprendizado colaborativo (em rede e em grupo), contextualização, interação, simulação, entre outros.

A expansão dos recursos de multimídia nos dispositivos móveis certamente expandirá o conceito de livro. Este se tornará em uma unidade integrada de conhecimentos que utilizará os multimeios e comunicação insight para transmitir informações atualizadas e acompanhar a formação dos leitores. Aproveitarão os recursos de realidade virtual, computação gráfica 3D para levar o leitor para uma realidade imersiva aonde poderá vivenciar uma série de informações e testá-las por simuladores no mundo digital.

Quais resultados se espera obter da educação e comunicação em uma sala de aula do futuro? No caso da saúde, como o senhor avalia a eficiência do uso das tecnologias no aprendizado?

Chao Lung Wen: A sala de aula do futuro tende a ser configurada em formato que possibilite o aprendizado em grupo (Team Based Learning), onde o aluno poderá aumentar as suas capacidades interativas individuais por meio da interação em grupo e desenvolver as habilidades de formar consensos. As atividades, os conteúdos e debates poderão ser registrados e disponibilizados imediatamente após as aulas, para fins de revisão.

As tecnologias móveis serão uma das grandes ferramentas para aprendizado em saúde. Digamos que com a criação de uma nuvem do conhecimento integrado a dispositivos móveis, poderíamos estruturar um programa de acessibilidade digital em saúde. As tecnologias de computação gráfica 3D, impressão 3D, realidade virtual/imersiva, visores holográficos, entre outros, serão importantes meios para formação de profissionais nas partes de habilidades cognitivas, psicomotoras etc.

Tendo em vista as mudanças que já têm acontecido na área da educação com o advento das novas tecnologias e com o uso de plataformas online, em que momento o senhor acredita que este processo será implantado amplamente no país?

Chao Lung Wen: Todos os bons cursos precisam pensar no futuro. Exemplo: um bom curso médico de hoje (2015) precisa pensar em formar o seu estudante para a realidade de 2021 e 2025 (fim de residência médica). Invariavelmente, no prazo de seis anos, para manter-se competitivo no cenário mundial, o Brasil precisará implantar uma boa estrutura tecnológica educacional. É uma ação de absoluta urgência. Se não for implantado, perderemos a competitividade internacional, pois não seremos capazes de formar bons profissionais, os custos com a educação serão muito altos ou então seremos colonizados. O país será apenas consumidor de recurso educacionais provenientes do exterior, e geraremos assim a balança comercial negativa do patrimônio intelectual educacional.

O senhor é coordenador do projeto Homem Virtual, da USP, que consiste na reprodução de imagens do corpo humano utilizando recursos computacionais. O que se espera alcançar nos estudos sobre saúde a partir deste projeto? Existe a possibilidade de uma parceria com a Fiocruz para o Homem Virtual ou em uma iniciativa futura?

Chao Lung Wen: O Homem Virtual é um projeto que nasceu em 2003. Um dos objetivos principais era criar unidades de conhecimentos que pudessem utilizar os métodos de comunicação gráfica e dinâmica para transmitir informações de alta qualidade científica de forma focada, simples, rápida e clara. Associadamente, que pudesse ser utilizado como roteiro de orientação de estudo e pudesse ser materializado fisicamente. Este último se tornou real com a popularização das impressoras 3D. Atualmente, a partir do acervo do Homem Virtual é possível produzir mais de 300 estruturas do corpo humano com detalhamento científico, desde nível molecular até nível anatômico. Quando integrado com a realidade aumentada usando tablets ou smartphones, estes dispositivos podem dar vida para as estruturas 3D impressas, facilitando o entendimento da fisiologia, fisiopatologia, entre outros.

Estas tecnologias interativas trouxeram outra perspectiva para o cenário da educação: a rede. Não há mais necessidade de um centro físico de produção. Os arquivos do Homem Virtual poderão ser enviados para qualquer local do mundo, e nestes locais, poderão reproduzir todo o acervo, até nas estruturas físicas em 3D. Nasce realmente o conceito de nuvem do conhecimento para o compartilhamento das excelências. 

Seria fundamental a parceria com a Fiocruz para a consolidação da nuvem do conhecimento, a formação núcleos de eficiência educacional  e de rede de excelências, entre outras ações conjuntas. O Homem Virtual e Impressora 3D são uma das soluções para reduzir o impacto em decorrência do grande aumento de escolas médicas sem infraestrutura para ensinar adequadamente as ciências morfológicas.

Dentro do conceito de redes, o senhor prevê também uma interação para além da sala de aula com alunos e professores de outros países visando o compartilhamento de conhecimento?

Chao Lung Wen: Sim. As plataformas educacionais, as redes sociais, a realidade virtual, as telepresenças e diversos outros recursos serão a base para compartilhamentos. O mundo evoluirá para Centrais colaborativos de conteúdos de qualidades e o Brasil precisará estar preparado. No futuro, as bibliotecas também expandirão as suas atividades para se tornarem centrais de gerenciamento de conhecimentos e locais para fins de consolidação formativa em equipe.

Imagem: Francisco Emolo / Jornal da USP / USP Imagens

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