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18/04/2013

Tese demonstra que aspectos políticos, disputas partidárias e interesses privados comprometem gestão do cuidado

Informe Ensp


“As assimetrias técnico-financeiras, as disputas político-partidárias por investimentos, a aplicação de recursos atrelados ao voto e, sobretudo, os interesses privados de formuladores de políticas, gestores e trabalhadores da saúde em detrimento do fortalecimento de um sistema público e universal comprometem a coesão necessária para constituir uma rede solidária de caráter regional”. Esse é um dos desafios apresentados por Adriano Maia dos Santos, em sua tese de doutorado em saúde pública, intitulada Gestão do cuidado na microrregião de saúde de Vitória da Conquista (Bahia): desafios para constituição de rede regionalizada com cuidados coordenados pela Atenção Primária à Saúde, defendida na Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz). Para ele, em oposição a esse desafio, a publicização da gestão e o envolvimento de representantes da sociedade civil organizada em defesa do Sistema Único de Saúde nas plenárias poderiam reduzir o campo do interesse privado nas decisões públicas.


 Para o pesquisador, os profissionais mais adequados para coordenação dos cuidados em rede regionalizada devem estar em equipes na Estratégia de Saúde da Família (ESF)

Para o pesquisador, os profissionais mais adequados para coordenação dos cuidados em rede regionalizada devem estar em equipes na Estratégia de Saúde da Família (ESF)





Na concepção de Santos, a gestão do cuidado na rede regionalizada de serviços de saúde modela uma imagem-objetivo: formuladores de políticas, gestores, trabalhadores da saúde e usuários devem se articular em diferentes espaços para resolver os problemas de saúde, utilizando a tecnologia mais adequada, no lugar e no tempo certo para produção do cuidado. De acordo com ele, a gestão do cuidado requer interdependência e cooperação entre os sujeitos e as instituições, para defesa da saúde como um direito de todos os cidadãos, em todas as fases da vida e ao longo do tempo, compartilhando os projetos terapêuticos e tendo o usuário como centro do cuidado.


Assim, explica Santos, a gestão do cuidado necessita de uma gestão democrática, com valorização dos trabalhadores, inserindo-os em processos de aprendizagem permanente. Tais processos devem apoiar práticas individuais e coletivas responsáveis com os itinerários terapêuticos dos usuários e as linhas de produção do cuidado, possibilitando a construção de vínculos de confiança e coeficientes de autonomia. Para o pesquisador, os profissionais mais adequados para coordenação dos cuidados em rede regionalizada devem estar em equipes na Estratégia de Saúde da Família (ESF), como centro de comunicação/articulação entre diferentes pontos da rede. Tal centro, acrescentou ele, deve funcionar de portas abertas às necessidades episódicas e regulares (porta de entrada preferencial) às demandas explícitas, bem como as que requerem investigação e vigilância, direcionadas às famílias, no seu cotidiano.


A ESF está presente em todos os municípios


O pesquisador elegeu para o estudo a microrregião de saúde de Vitória da Conquista (macrorregião sudoeste da Bahia), que possui 632.708 habitantes, divididos em 19 municípios. Todos os municípios assinaram o Pacto pela Saúde, mas apenas cinco deles (Barra do Choça, Belo Campo, Maetinga, Presidente Jânio Quadros e Vitória da Conquista) assumiram o Comando Único, e os demais permaneceram sob gestão estadual dos serviços de saúde. Em relação à oferta de serviços, Adriano informou que a ESF está presente em todos os municípios com uma elevada cobertura formal (> 70%), com exceção de Encruzilhada (58%) e Vitória da Conquista (42%). A população não cadastrada em Unidades de Saúde da Família (USF), nos diferentes municípios sem plena cobertura da ESF, possuem Unidades Básicas de Saúde (UBS) como unidades de referência. Outro dado relevante é que Vitória da Conquista tem 100% de cobertura formal de ESF na zona rural.


Estágio atual da Atenção Primária à Saúde em Vitória da Conquista


A pesquisa de Adriano também constata a centralidade da Atenção Primária à Saúde (APS), que é condicionada pela baixa cobertura real da ESF, pouca disponibilidade de profissionais (médicos, em particular), insuficiente adensamento tecnológico das USF, baixa capacidade técnica dos profissionais, escassa oferta de serviços especializados e de apoio diagnóstico em tempo oportuno e matriz tecnológica subjacente ao modelo de atenção em curso na microrregião.


“Os profissionais da atenção primária, sobretudo médicos, são responsáveis pelas referências para outros pontos de atenção na rede SUS, por meio de formulários específicos (guias de solicitação), mediados por centrais reguladoras municipais ou regionais que, por sua vez, restringem a referência às regras administrativas sem qualquer possibilidade de escolha entre os prestadores (critério por disponibilidade do serviço), pelos profissionais ou usuários”, complementou. Segundo Santos, a organização da ESF na microrregião apresenta questões problemáticas também relacionadas à insuficiência de cobertura real e elevado número de pessoas cadastradas por equipe, que, atrelados à baixa disponibilidade de médicos nas USF, dificultam o acesso oportuno de usuários aos serviços de APS.


A cobertura formal da estratégia está acima de 80% em 15 dos 19 municípios. Isso indica que coberturas altas e potencialmente satisfatórias nem sempre se traduzem em melhor utilização da capacidade disponível. Vale notar, contudo, que a própria expansão das equipes fica limitada pela baixa oferta de médicos e insuficiência no financiamento que, paradoxalmente, são agravados por gastos com pagamento de salários de profissionais. Outra questão apontada pelo pesquisador é a dificuldade de atração e fixação de médicos, atrelada à ausência de uma política consistente de gestão do trabalho. Isso abre espaço para inúmeros acordos informais, entre gestores e profissionais, que “autorizam” a redução na carga horária, flexibilização das funções a serem desenvolvidas na equipe, pagamento de salários acima da média. Tais procedimentos colaboram para aumentar a rotatividade desses profissionais e a competição entre municípios, agravando a situação da ESF na microrregião.


Adriano Maia dos Santos é cirurgião-dentista, com mestrado em saúde coletiva (Universidade Estadual de Feira de Santana) e doutorado em saúde pública (Ensp/Fiocruz). Atualmente, é professor na Universidade Federal da Bahia (UFBA), Instituto Multidisciplinar em Saúde - Campus Anísio Teixeira (Vitória da Conquista), nos cursos de graduação de enfermagem, farmácia e nutrição. Sua tese foi orientada pela pesquisadora Lígia Giovanella, da Ensp/Fiocruz.


Publicado em 17/4/2013.

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