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25/07/2008

Tese indicada a prêmio explica as ações públicas de combate à hanseníase no país

Edna Padrão


“Em proveito dos sãos, perde o lázaro a liberdade” – Uma história das políticas públicas de combate à lepra no Brasil (1941-1962) é o título da tese de doutorado defendida na Universidade Federal Fluminense (UFF) pela pesquisadora Laurinda Rosa Maciel, chefe do Departamento de Arquivo e Documentação da Casa de Oswaldo Cruz (COC) da Fiocruz. A tese foi uma das duas indicadas pela UFF à segunda edição do Prêmio Anpuh-Rio de História e o resultado será anunciado durante o Encontro Regional de História do Rio de Janeiro no dia 7 de agosto.


O interesse da pesquisadora em estudar aspectos que explicam e contextualizam as ações públicas no combate à doença no país surgiu com os trabalhos desenvolvidos no âmbito do projeto Memória e história da hanseníase no Brasil através de seus depoentes (1960-2000). Esta pesquisa, concretizada por meio de uma parceria entre unidades da Fiocruz e a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), resultou em cerca de 85 horas de entrevistas gravadas com profissionais de saúde, pacientes e ex-pacientes, submetidos ou não ao isolamento compulsório em leprosários.


Até o final de 2008 será lançado um site que abrigará os depoimentos desses entrevistados, além de imagens, teses, livros e artigos, inclusive materiais que compõem o Arquivo Pessoal de Heráclides de Souza-Araújo, discípulo de Adolpho Lutz. A aproximação dos dois levou Souza-Araújo a se interessar pelo estudo da lepra e, ao lado de Lutz, tornou-se referência no tema.


 Heráclides de Souza-Araújo (1886-1962), discípulo de Adolpho Lutz (Fonte: Acervo COC/Fiocruz)

Heráclides de Souza-Araújo (1886-1962), discípulo de Adolpho Lutz (Fonte: Acervo COC/Fiocruz)


Medidas profiláticas

A partir de 1975, a doença passou a ser oficialmente chamada de hanseníase e, ainda hoje, é acompanhada de grande estigma social. Segundo Laurinda, “a doença é uma questão de saúde pública; ela pertence à lista das doenças negligenciadas”. Desde os anos de 1920, a hanseníase foi efetivamente alvo de preocupação das autoridades sanitárias e objeto de políticas de controle. Em 1941, após a criação do Serviço Nacional da Lepra (SNL), o governo federal celebrou acordos de cooperação com os estados, no sentido de efetivar, em todo o território nacional, um modelo de profilaxia denominado modelo tripé. Este era amparado na união de três instituições: o leprosário, o preventório e o dispensário, onde cada um tinha um papel para controlar a doença. No entanto, com o passar do tempo, esta estrutura foi considerada ineficiente e hoje, inclusive, os pacientes que foram internados compulsoriamente têm direito a uma pensão indenizatória. 


 Banda do Hospital de Curupaity, composta pelos internos. A dedicação às artes era uma estratégia para resgatar algum aspecto lúdico da vida nos leprosários (Fonte: Souza-Araújo, <EM>História da Lepra no Brasil</EM>, 1956)

Banda do Hospital de Curupaity, composta pelos internos. A dedicação às artes era uma estratégia para resgatar algum aspecto lúdico da vida nos leprosários (Fonte: Souza-Araújo, História da Lepra no Brasil, 1956)


Respaldados pelos congressos nacionais e internacionais e pelos desdobramentos experimentados pela medicina, com descobertas e avanços da pesquisa básica após a década de 1940, além da descoberta de antibióticos, foi pensada uma nova maneira de tratar a doença, desta vez fora dos leprosários e sim nos ambulatórios. Assim, o Ministério da Saúde concretizou, após 1956, a Campanha Nacional contra a Lepra, elaborada pelos profissionais do SNL. Segundo Laurinda, percebe-se aí uma forma diferenciada de olhar e tratar a doença e o doente. “Esta campanha foi uma alternativa para se tentar mudar o quadro da doença. Utilizavam-se antibióticos e sulfas, as unidades de trabalho eram descentralizadas e havia a união das três esferas governamentais – União, estados e municípios”, diz ela.


 Cartaz utilizado na campanha de combate ao estigma da hanseníase, elaborado e distribuído por uma ONG holandesa em Duque de Caxias (RJ), município que apresenta uma das maiores prevalências da doença no estado (Fonte: Acervo Ibiss)

Cartaz utilizado na campanha de combate ao estigma da hanseníase, elaborado e distribuído por uma ONG holandesa em Duque de Caxias (RJ), município que apresenta uma das maiores prevalências da doença no estado (Fonte: Acervo Ibiss)


A doença hoje

Os estudos de Laurinda confirmaram também que a hanseníase é uma doença presente, sobretudo, nas camadas sociais menos favorecidas, já que está ligada a condições e hábitos de vida. “Isto não significa dizer que ela não ocorra em contextos diferentes, mas é menos freqüente”, explica. Somente em 2006, no Brasil, o Ministério da Saúde atendeu a cerca de 45 mil novos casos, sendo um grande número de pacientes com alto grau de incapacidade, o que demonstra um longo tempo de adoecimento e a demora para procurar os serviços de saúde. “Ainda existe um longo caminho a se percorrer para que a hanseníase deixe de ser uma questão de saúde pública no Brasil, mas muito já tem sido feito”, finaliza.


Atualmente, equipes do Programa Saúde da Família (PSF) recebem treinamento para identificar possíveis portadores da doença. No Rio de Janeiro, a maioria dos casos se encontra na Baixada Fluminense e na Zona Oeste. No Brasil, em 2006, a região que apresentou o maior índice foi a Nordeste, mas o estado do Pará concentrou o maior número de casos novos (isto é, sem considerar os pacientes que já se encontravam em tratamento).


Publicada em 23/07/2008

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