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24/02/2011

Trabalho mostra como a ciência é abordada em cadernos infantis de jornais

Renata Moehlecke


Investigar como se dá a cobertura de ciência em suplementos infantis de jornais impressos no Brasil: esse é o principal objetivo da dissertação recém-defendida no Programa de Ensino em Biociências e Saúde do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz) pela jornalista Catarina Chagas. A estudante analisou um total de 103 edições do Globinho e da Folhinha publicadas durante 2008, quando os suplementos completaram 70 e 40 anos, respectivamente. Ela também entrevistou as editoras e repórteres dos dois suplementos para esclarecer os processos de produção do material estudado. Os resultados apontaram que, embora não sejam especializados em ciência, ambos os suplementos constituem importantes veículos de divulgação científica para o público infantil, em especial no que se refere a ciências biológicas e humanas.



“No Brasil, são raros os veículos de comunicação que reservam espaço exclusivo para a divulgação científica voltada ao público infantil”, comenta Catarina. “Ambos os suplementos assumem como missão apresentar os temas científicos de forma desafiadora e que desperte a curiosidade das crianças, sem tratar os conteúdos de maneira excessivamente simplória. Porém, raramente apresentam aos leitores os riscos e questões controversas da ciência, que poderiam suscitar um debate mais profundo acerca das pesquisas científicas”.


Segundo a pesquisadora, a divulgação científica para o público infantil deve respeitar a capacidade das crianças de refletirem e tirarem suas próprias conclusões. “É importante que a criança-leitora se sinta por vezes instigada a compreender temas e conceitos ainda desconhecidos para ela, sendo ajudada, para isso, pelos materiais que lhes são disponibilizados. Do contrário, os leitores podem considerar o material ‘bobo’ e ‘fácil demais’”, explica a jornalista. “Outro erro comum nos veículos voltados para crianças é tratá-las como receptoras passivas, desmerecendo seu papel social ativo e produzindo materiais que não necessariamente correspondem aos interesses do público leitor”.


A pesquisa apontou que, do total de textos analisados, 30,6% eram matérias jornalísticas, 14,6%, dicas de exposição ou evento com temas de ciência, 10,8%, dicas de livros ou jogos com temática científica, 10,5%, jogos e passatempos e o restante, quadrinhos, notas curtas, cartas e desenhos dos leitores, contos e poesias, dicas de peças de teatro e dicas de filmes e programas de TV. Com relação ao conteúdo dos textos, uma das áreas do conhecimento que apresentou mais inserções (23,6%) foram as ciências biológicas, sendo o principal tema abordado os animais (59,6%), com destaque ainda para botânica, corpo humano, ecologia, dinossauros e paleontologia.


Empatada com o mesmo número de inserções, as ciências humanas ofereceram como principais temas história – sobretudo do Brasil, com destaque para as comemorações de 200 anos da vinda da família real portuguesa e 100 anos da imigração japonesa no país –, geografia – também com destaque para o Brasil, mas incluindo outros países –, arqueologia, filosofia e culturas de diferentes países e regiões do Brasil. Além disso, a área das ciências exatas e da Terra contou com 10,5% das inserções, cobrindo assuntos sobre água, astronomia, física, mudanças climáticas e desastres naturais. Em relação às ciências da saúde (9,2% das inserções), os temas de destaque foram nutrição, dengue e saúde da criança de uma maneira geral.


O estudo ainda mostrou que 49% dos textos sobre ciência não tinham indicações sobre seus autores, assim como 66% não tinham referencias a fontes, informações consideradas importantes em reportagens voltadas para o público adulto. “A menção a fontes pode se tornar desnecessária diante de um espaço limitado de texto”, explica a estudante. “Nas entrevistas, as jornalistas explicaram também que nem sempre os assuntos e as formas de abordagem consideradas ideais para o público adulto são adequados ao público infantil”. Ela acrescenta que nem sempre pautas retiradas das editorias de ciência dos jornais servem como sugestão para os suplementos infantis. “Uma das entrevistadas citou que muitas vezes os suplementos não vivem de notícias, mas de boas ideias, que estimulam a curiosidade das crianças”. As conversas apontaram também que não existe no país nenhum tipo de formação específica para escrever para o público infantil. “Tudo é feito na base da tentativa e do erro”, conclui Catarina.


Publicado em 22/2/2011.

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