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22/01/2007

Vítima de anorexia nervosa fala sobre como foi o processo de descoberta, desenvolvimento e cura da doença

Danielle Neiva


De longe, a anorexia e a bulimia podem parecer caprichos de mulheres preocupadas com a estética. Mas não é assim que especialistas da área da saúde identificam esses distúrbios alimentares, que devem ser tratados com o máximo de atenção e cuidado. Na entrevista à Agência Fiocruz de Notícias (AFN), a administradora de empresas Beatriz Ayres, de 35 anos, há cinco anos curada da anorexia nervosa, relata o que passou durante o ano em que foi vítima do transtorno e diz como foi perder 18 quilos em três meses e conseguir se recuperar a base de uma dieta rica em alimentos que a ajudaram a restabelecer o prazer pela comida. A seguir, a administradora de empresas revela suas angústias e os cuidados que ainda possui para não voltar a ter o transtorno.


 Para especialistas, a mídia expõe imagens que, equivocadamente, associam a felicidade à magreza

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Agência Fiocruz de Notícias: Como começaram os distúrbios alimentares?

Beatriz Ayres:
Olhei para o espelho e não gostei do que vi, estava me sentindo muito acima do peso. Algumas partes do meu corpo estavam cheinhas. As pessoas me diziam que eu estava bem, que tinha um corpão, já que sou alta (1,76m), mas não estava satisfeita. Não que estivesse obesa ou quisesse exibir um corpo escultural, mas não estava bem comigo mesma. Pode parecer besteira, mas quem na nossa sociedade tão rotulada não se preocupa com a aparência?


AFN: Você queria estar dentro dos padrões de beleza definidos pela nossa sociedade?

BA:
Precisava estar em harmonia comigo mesma, mas não conseguia me enxergar assim. Comecei uma dieta para tentar perder alguns quilos, tirando os excessos, mas perdi o controle. Em apenas três meses perdi 18 quilos. Tinha 69kg e fui para 51kg. Comecei comendo bem pouco, até que meu estômago passou a rejeitar comida. Tudo que ingeria colocava para fora. Estava vivendo um momento difícil, com muita pressão no trabalho. Estava mudando de setor, assumindo mais responsabilidades e tudo precisava ser reorganizado em pouco tempo.


AFN: Você acha que o seu lado emocional influenciou diretamente no desenvolvimento do distúrbio alimentar?

BA:
Com certeza. As pessoas contavam comigo, com o meu trabalho. Eu precisava ser competente nas tarefas, mas eu não conseguia mais me concentrar. Meu rendimento caiu muito. Estava depressiva, só tinha vontade de chorar. Não cheguei a me isolar, mas me tornei uma pessoa calada e triste. Sentia o meu corpo tremer sem parar e não encontrava solução para o meu problema. Hoje sei que eram conseqüências da ausência de alimentos. Estava abalada emocionalmente e fisicamente. Tinha anorexia nervosa e não fazia idéia dos riscos da doença.


AFN: Quando você percebeu que precisava de ajuda médica?

BA:
Toda aquela ansiedade foi revertida em ausência total de fome. Eram dias inteiros sem comer absolutamente nada e quando lembrava de comer ou até forçava, meu organismo rejeitava. Sabia que não era normal vomitar todos dias. As pessoas começaram a perceber o meu comportamento e estranharam a minha magreza repentina. Foi tudo muito rápido e não tive como controlar. Foi quando procurei ajuda médica. Fiz muitos exames até que o médico alertou-me de que não se tratava de gastrite, e sim, anorexia nervosa.


AFN: O que você achou de iniciar um tratamento psiquiátrico?

BA:
Na época não achei normal, mas com o tempo entendi que trata-se de uma doença mental, que age inconscientemente e por isso requer tratamento com um especialista em transtornos alimentares.


AFN: Como foi o seu tratamento?

BA:
A recomendação foi introduzir apenas os alimentos que mais gostava, como chocolates, sorvetes e outros tipos de doces. Tive que reaprender a ter prazer pela comida e a não sentir culpa por ter apetite. Da descoberta da doença até a cura durou apenas um ano, mas sei que na maioria das vezes o sofrimento leva mais tempo, pois é preciso ter informação e principalmente apoio. Nunca fui chamada de louca ou mimada, e sim, como alguém que estava doente e precisava de tratamento. Com a ajuda de pessoas competentes e amigos, me curei.


AFN: Você ainda usa medicamentos?

BA:
Na época da doença precisei ingerir antidepressivos por causa do tratamento de estímulo a fome. Atualmente, faço tratamento ortomolecular e como a minha médica sabe que já tive o distúrbio, o tratamento que faço é todo regulado, pois sei que se não me cuidar posso desenvolver um quadro de anorexia novamente, já que não existe cura definitiva. Hoje, quero estar bem, em harmonia com meu corpo e mente e, acima de tudo, saudável.

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