Início do conteúdo

13/07/2012

Vetores, bactérias e protozoários resistentes às substâncias de controle são tema da 'Memórias do IOC'

Isadora Marinho


A nova edição da revista Memórias do Instituto Oswaldo Cruz está disponível online. A publicação traz dados inéditos sobre a ocorrência, no Brasil, de bactérias Enterococcus faecalis tipo vanB, resistentes ao tratamento com vancomicina e outros agentes antimicrobianos. A resistência também é tema de um artigo sobre a queda progressiva na eficácia dos dois grupos de inseticidas amplamente utilizados para controle de insetos vetores de doenças relevantes, como dengue. Ainda nesta edição, o helminto causador da triquinose é analisado sob uma nova perspectiva: a de agente inibidor de processos inflamatórios em doenças autoimunes e alérgicas. Por fim, pesquisa que investigou a enzima ascorbato peroxidase, presente no Trypanosoma cruzi, sugere que a resistência do parasito ao medicamento quimioterápico usado no tratamento da doença de Chagas – o benzonidazol – está ligada à capacidade antioxidante de seu sistema de defesa. Para acessar gratuitamente o periódico, clique aqui.


 O vetor da dengue, o mosquito <EM>Aedes aegypti</EM>, em foto publicada na capa da atual edição da revista (Foto: Genílton Vieira)

 O vetor da dengue, o mosquito Aedes aegypti, em foto publicada na capa da atual edição da revista (Foto: Genílton Vieira)





Nos últimos anos, a comunidade científica vem se deparando com um aumento preocupante na resistência que os inseticidas químicos encontram em populações de vetores de doenças. A "resistência metabólica" é um dos principais mecanismos responsáveis por esse fenômeno. Trata-se da capacidade que o inseto tem de se desintoxicar por meio da produção de enzimas específicas que promovem a hidrólise das substâncias nocivas a ele – no caso dos inseticidas, os ésteres, empregados nas duas classes de produtos mais utilizadas no mundo: os inseticidas piretróides e os organofosforados.


No estudo, pesquisadores do Laboratório de Fisiologia e Controle de Artrópodes Vetores do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), do Instituto de Biologia do Exército e do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia em Entomologia Molecular, localizados no Rio de Janeiro, investigaram a possibilidade de criação de um critério de nomenclatura universal para a família de enzimas esterases encontradas nas diferentes espécies de vetores. A partir da análise de casos, o estudo indica que as espécies compartilham poucos genes ortólogos, ou seja, genes de espécies diferentes, e que diferentes populações de insetos desenvolvem métodos particulares de neutralização, conforme as substâncias presentes em seus habitats. A conclusão foi de que a filogenética parece ser o melhor ponto de partida para se estabelecer um sistema de nomenclatura universal.


Superbactéria em solo brasileiro


Pesquisadores do Departamento de Microbiologia, Imunologia e Parasitologia da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), do Instituto de Microbiologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e do Instituto Biomédico da Universidade Federal Fluminense (UFF) realizaram estudo pioneiro que apontou e analisou a ocorrência, no Brasil, de amostras de Enterococcus faecalis com gene vanB de resistência ao antibiótico vancomicina. Os Enterococcus estão entre os principais responsáveis por infecções hospitalares no mundo e têm grande capacidade de desenvolver resistência a medicamentos antimicrobianos. São habitantes do trato gastrointestinal, sendo a espécie E. faecalis uma das mais recorrentes.


Os cientistas caracterizaram três isolados, nos quais foi identificada a presença do gene de resistência vanB1, que costuma ser menos recorrente que o vanB2. No estudo, as cepas mostraram ser suscetíveis à maioria dos agentes antimicrobianos testados, à exceção do cloranfenicol, da eritromicina e da vancomicina. Além disso, apresentaram perfis distintos de alta resistência aos bactericidas aminoglicosídeos – enquanto a análise por eletroforese em campo pulsado (ECP) mostrou que, embora tenham sido coletadas em dois hospitais diferentes do Rio de Janeiro, as cepas pertenciam ao mesmo grupo clonal. Ou seja, parecem já estarem difundidas.


Parasitas para o controle de doenças autoimunes


A espécie Trichinella spiralis causa uma perigosa infecção parasitária que pode culminar em insuficiência cardíaca. Ao mesmo tempo, a presença do helminto no organismo do hospedeiro atenua sua resposta imunológica em processos alérgicos e autoimunes. Nesta pesquisa, conduzida no Laboratório de Referência de Triquinoses do Instituto de Aplicação para Energia Nuclear e do Instituto de Microbiologia e Imunologia da Universidade de Belgrado, na Sérvia, pesquisadores descobriram que a T. spiralis produz epítopos – menor porção de antígeno com potencial de gerar a resposta imune – em comum com os do hospedeiro, por meio de expressão gênica, o que impede o sistema imunológico de reconhecê-la. Uma vez instalada em uma célula de músculo estriado, ela passa a produzir a proteína TSL-1, que limita os processos inflamatórios provocados por alergias e doenças autoimunes. Logo, o estudo aponta a proteína do parasita como forte candidata para estudos de controle destas doenças.


Novo alvo no combate à doença de Chagas


Desenvolvido por pesquisadores do Laboratório de Parasitologia Celular e Molecular da Fiocruz Minas, estudo comprovou que o nível da enzima ascorbato peroxidase (APX) é aumentado em populações de Trypanosoma cruzi com resistência ao benzonidazol, medicamento utilizado no tratamento da doença de Chagas. Além disso, sua expressão aumenta durante a exposição ao peróxido de hidrogênio. O ascorbato peroxidase (APX), presente no T. cruzi, desintoxica peróxidos, tais como o peróxido de hidrogênio, convertendo-os em moléculas de água.


Durante a pesquisa, linhagens do protozoário sensíveis e resistentes ao benzonidazol foram analisadas. Comparada aos homólogos sensíveis ao quimioterápico, a expressão da enzima ascorbato peroxidase presente no T. cruzi (TcAPX) foi duas vezes maior nas populações com resistência induzida in vitro ao benzonidazol e três vezes maior nas cepas in vivo selecionadas. Além disso, as duas populações também mostraram tolerância maior à exposição ao peróxido de hidrogênio e, ainda, aumento nos níveis de TcAPX conforme a exposição ao peróxido de hidrogênio aumentava de 100 a 200 μM. Por fim, os pesquisadores acreditam que esta enzima, que desempenha importante papel no processo antioxidante do sistema de defesa do parasita, é um alvo a ser considerado no desenvolvimento de novos quimioterápicos contra a doença de Chagas.


Publicado em 9/7/2012.

Voltar ao topo Voltar