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09/11/2017

Consulta Agenda 2030: C&T devem promover inclusão social

André Costa (Agência Fiocruz de Notícias)


“A Ciência, Tecnologia e Inovação (CT&I) do setor de saúde devem incorporar os fundamentos da inclusão social, do uso adequado dos recursos naturais e a integração de políticas para obter efetividade nas suas intervenções”. Com essas palavras, o gerente da área de Desenvolvimento Sustentável e Saúde Ambiental da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas) e assessor internacional do Centro de Relações Internacionais em Saúde da Fiocruz (Cris/Fiocruz), Luiz Augusto Galvão, fez o balanço das conclusões do segundo dia da consulta internacional sobre ciência, tecnologia e inovação na implementação da Agenda 2030, promovida pela Fiocruz em parceria com diversos programas e agências da ONU, e realizada no Rio de Janeiro entre os dias 6 e 8 de novembro.

Segundo dia do evento apresentou balanço da consulta internacional sobre ciência, tecnologia e inovação na implementação da Agenda 2030 (foto: Peter Ilicciev)

 

Avaliando o saldo dos dois primeiros dias do evento, o coordenador do Cris/Fiocruz, Paulo Buss, afirmou que o resultado dos debates, que agora devem ser sistematizados em um documento que será encaminhado como contribuição ao Fórum de Ciência, Tecnologia e Inovação das Nações Unidas, precisa chegar “à comunidade científica, a gestores e à sociedade civil”. Esta medida, destacou Buss, ajudará na coordenação global, regional e nacional, o que deve auxiliar a mitigar o “fracionamento dos conhecimentos”, um dos pontos identificados por ele como merecedores de atenção.

O pesquisador ressaltou o tema dos indicadores dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), que por diversas vezes foram apontados nos debates como problemáticos por serem vagos ou pouco específicos. Foi ponto pacífico nas conversas que muitos países, especialmente os menos desenvolvidos, não dispõem de registros ou bancos de dados capazes de monitorar a implementação da Agenda. 

A respeito do tema dos indicadores, o assessor regional em epidemiologia da Opas, Oscar Mujíca, afirmou que “não há um só indicador que dê conta da capacidade dos países de não deixar ninguém para trás”, em referência ao slogan da Agenda. Ainda sobre este assunto, o coordenador da Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030, Paulo Gadelha, ressaltou que “se não houver capacidade de geração, reunião e tratamento de dados, não conseguiremos avaliar a efetividade das políticas adotadas”. 

Coordenador da Estratégia Fiocruz para a Agenda 2030, Paulo Gadelha falou sobre a necessidade de uma “apropriação pública de conhecimento sobre a Agenda 2030" (foto: Peter Ilicciev)

 

Gadelha também chamou a atenção para “um ponto essencial, muito presente na tradição brasileira”: a necessidade de uma “apropriação pública de conhecimento sobre a Agenda 2030 e de um engajamento da população. Enquanto esta não for protagonista ativa da compreensão e do encaminhamento de políticas e de ações, estaremos em um campo retórico sem enraizamento e consequências”.

Nas considerações que encerraram o dia de discussões, Galvão, responsável por apresentar um resumo do que foi abordado, destacou quatro elementos recorrentes nos debates relacionados à CT&I na Agenda 2030: 1) É necessário se apropriar do poder da CT&I para alcançar os ODS; 2) É preciso haver mobilização, engajamento e convergência de ações para o cumprimento da Agenda; 3) São necessários mecanismos de incentivo para criação e disseminação de CT&I para os ODS; 4) Os meios de governança e de financiamento de políticas relacionadas à Agenda 2030 precisam ser melhor definidos. 

“Não é aceitável que haja tecnologias incompráveis”

Em relação à apropriação da CT&I para a Agenda 2030, Galvão encorajou os governos “a regular, incentivar e até mesmo criar mercados relacionados ao complexo econômico da CT&I e saúde na direção dos ODS”. 

Esta recomendação de que governos se valham de seu poder de compra para incentivar o setor da ciência, tecnologia e inovação baseou-se em grande parte na intervenção do Coordenador de Ações de Prospecção da Fiocruz, Carlos Gadelha, que falou sobre o complexo econômico e industrial da saúde. Segundo dados que apresentou, o setor da saúde caracteriza-se por desigualdades entre as nações e entre o setor público e o privado - como exemplo, 61% das patentes em biotecnologia são concentradas por 15 empresas globais. 

Coordenador de Ações de Prospecção da Fiocruz, Carlos Gadelha falou sobre o complexo econômico e industrial da saúde (foto: Peter Ilicciev)

 

Segundo o pesquisador, isso garante a essas companhias um poder de pressão política enorme, que deve ser combatido em nome do bem público. “A Agenda 2030 precisa gerar mecanismos de mitigação que atuem para limitar as assimetrias existentes. Não é aceitável que haja tecnologias incompráveis. O poder do mercado é tamanho que a União Europeia e o Mercosul discutem hoje não poder usar o poder público de compra para estimular a inovação - isso inviabilizaria um fator decisivo para a inovação, que é a garantia de mercado”, comentou.

O coordenador do Cris/Fiocruz, Paulo Buss, levantou questões complementares às de Carlos Gadelha, em sua fala sobre a governança global da saúde. “É fundamental o tema do acesso às tecnologias disponíveis, que hoje têm distribuição absolutamente inequitativa”, afirmou. Para superar este desafio, o pesquisador sugeriu a coordenação de núcleos de CT&I no interior do sistema ONU, a articulação entre a OMS e os grandes institutos de pesquisa do mundo e acordos de cooperação sul-sul, entre outros.

Coordenador do Cris/Fiocruz, Paulo Buss destacou que resultado dos debates será sistematizado em documento encaminhado como contribuição ao Fórum de Ciência, Tecnologia e Inovação das Nações Unidas (foto: Peter Ilicciev)

 

O segundo dia contou ainda com palestras sobre inovação do diretor da empresa Oracle Health Sciences, Summerpal Kahlon; sobre o acesso universal a água, de José Vieira, da Universidade do Minho; de tecnologias para a saúde, de Gabriela Prada, conselheira de saúde do Canáda; uma análise prospectiva do mundo em 2050, pelo representante do Instituto Interenacional para a Pesquisa Aplicada (IAASA), Neboja Nakicenovic; uma intervenção sobre a importância dos fatores sociais, econômicos e demográficos dos ODS, pelo pesquisador da Fiocruz Maurício Barreto; sobre conhecimentos tradicionais, pela presidente do Centro de Autonomia e Desenvolvimento da População Indígena da Nicarágua, Myrna Cunninham; e sobre a busca pela equidade em saúde, pelo representante da Opas, Oscar Mujica.

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