18/07/2017
Uma parte fundamental da pesquisa científica acontece do lado de fora dos laboratórios: o trabalho de campo permite conhecer mais sobre o ciclo de transmissão de doenças e seus vetores. Quando se trata do estudo de animais peçonhentos, aqueles que produzem algum veneno, o cuidado deve ser redobrado. O programa de Pós-graduação Stricto sensu em Medicina Tropical do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), em parceria com o Instituto Vital Brazil, realizou, entre os dias 10 e 14 de julho, a disciplina Animais Peçonhentos de Importância Médica. A capacitação chamou a atenção para os principais causadores de acidentes no Brasil, entre espécies de serpentes, escorpiões e aranhas. Ao todo, participaram 25 pessoas, entre estudantes e pesquisadores do IOC, de outras unidades da Fiocruz, e das secretarias de saúde do estado, do município do Rio de Janeiro e de cidades vizinhas. “O conhecimento sobre os animais peçonhentos é fundamental para ampliar a capacidade de reconhecer possíveis ameaças em campo e no dia a dia”, destacou Elba Lemos, chefe do Laboratório de Hantaviroses e Rickettsioses do IOC/Fiocruz e uma das coordenadoras dessa oportunidade de formação.
As características do comportamento e da biologia de serpentes foram apresentadas pelo biólogo Claudio Machado, do Instituto Vital Brazil, que também coordena a iniciativa. Ele abordou, ainda, aspectos do manejo dos principais grupos de interesse médico, como as espécies conhecidas como jararaca, cascavel e coral. Ele ressaltou, ainda, a importância da notificação de acidentes por animais peçonhentos junto ao Sistema de Informação de Agravos de Notificação (Sinan). Esses registros permitem a realização de diagnósticos dinâmicos da ocorrência de algum tipo de evento na população e contribuem para a identificação da realidade epidemiológica de determinada área geográfica.
‘Viúva-negra’ e ‘marrom’ são algumas das aranhas mais conhecidas (e temidas) entre a população. Não é por menos: o veneno produzido por esses animais pode causar consequências graves ao organismo humano. A picada da aranha marrom pode levar a quadros de febre, mal-estar e queda de pressão, com a manifestação de necrose no tecido próximo à área atingida. Já o ataque da viúva-negra afeta o funcionamento do sistema nervoso central. Esses foram alguns dos esclarecimentos feitos pelo biólogo Claudio Maurício Vieira de Souza, do Instituto Vital Brazil.
Cemitérios, madeireiras e locais com acúmulo de lixo são alguns dos ambientes preferidos dos escorpiões. A espécie Tityus serrulatus, em especial, conhecida como escorpião-amarelo, é responsável por acidentes com humanos em diferentes regiões do país. Isso acontece porque a fêmea do aracnídeo consegue se reproduzir por partenogênese, ou seja, sem a necessidade do macho para dar continuidade à prole.
De acordo com Elba, que abordou a importância e o impacto das zoonoses, a picada por animais peçonhentos deve ser lavada e o paciente encaminhado para tratamento médico o mais rapidamente possível. Deve-se evitar procedimentos como o uso de torniquetes, garrotes, sugar a área exposta à picada ou a exposição da pessoa atingida a grandes esforços físicos.
A descoberta de Vital Brazil sobre a especificidade dos soros antipeçonhentos estabeleceu um novo conceito na imunologia, enquanto seu trabalho sobre a dosagem dos soros antiofídicos deu origem a uma tecnologia inédita. Esta e outras contribuições do cientista foram lembradas, no encontro, por Erico Vital Brazil, neto do cientista. A iniciativa destacou, ainda, os procedimentos necessários em casos de acidentes com animais peçonhentos, a produção de soros no Brasil e o panorama do Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas (Sinitox/Fiocruz), responsável por coordenar o processo de coleta, compilação, análise e divulgação dos casos de intoxicação e envenenamento notificados no país.