03/11/2015
Solange Argenta (Fiocruz Pernambuco)
Quem chega à Unidade de Pronto Atendimento (UPA) de Paulista, em Pernambuco, com suspeita de dengue é convidado a colaborar com um novo estudo, desenvolvido pela Fiocruz no estado, que busca um diagnóstico mais preciso da doença. A pesquisa busca estabelecer marcadores prognósticos que sinalizem se há risco da dengue evoluir para a forma mais grave e que ajudem a diferenciar a doença de outras também febris agudas. Isso é necessário porque o diagnóstico e manejo clínico dos casos de dengue ainda representa um grande desafio para os serviços de saúde.
Em cinco meses de realização da pesquisa, um total de 140 pacientes foi recrutado, com cerca de 480 visitas à unidade de saúde (foto: Informe Fiocruz Pernambuco)
Os resultados, além de ajudar a salvar vidas, poderão refletir numa melhor utilização dos leitos hospitalares disponíveis no Sistema Único de Saúde (SUS) e irão ajudar na revisão da classificação de casos clínicos de dengue adotada pela Organização Mundial da Saúde (OMS). O estudo faz parte de um consórcio internacional de pesquisa em dengue da Comissão Europeia, denominado International Research Consortium on Dengue Risk Assessment, Management and Surveillance (Idams) e é executado em consonância com estudos em andamento em vários outros países. A iniciativa também conta com recursos do programa PPSUS/Facepe.
Um dos diferenciais da investigação, coordenada localmente pelo pesquisador Ernesto Marques, é o foco em pacientes com sintomas iniciais. No momento da triagem, pessoas que atendem a determinados critérios como - suspeita de dengue, tempo máximo de 72h desde o início da febre, idade acima de cinco anos, entre outros – e aceitam participar do estudo são acompanhadas enquanto dura a febre e na convalescença, retornando à UPA para novos exames clínicos e coleta de amostras de sangue. A ideia é observar a evolução da enfermidade antes do aparecimento dos sintomas da dengue severa (classificação da OMS de 2009, que substituiu o termo dengue hemorrágica).
O exame clínico realizado nessas visitas é bem extenso e as amostras são coletadas para diversos fins, como análises bioquímicas e de hemograma, diagnóstico da doença, e também para estudos mais específicos de interesse do grupo da Fiocruz. Das análises já realizadas em Pernambuco, cerca de 20% apresentaram positividade para dengue e para mais de um sorotipo. “Esses resultados parciais mostram a circulação do vírus dengue numa porcentagem relativamente alta da população do estudo, em um período não epidêmico. Sinaliza também que alguns dos casos restantes podem ser de outros arbovírus que estão atualmente causando preocupação e podem estar em circulação, como o zika e chikungunya”, explicou a pesquisadora colaboradora da Fiocruz Pernambuco Tereza Magalhães, uma das líderes responsáveis pelo planejamento e supervisão das atividades do projeto. Ela informa que serão realizados, eventualmente, testes para esses outros vírus. “Os dados desse estudo (junto com as demais localidades pesquisadas pelo IDAMS) poderão ser importantes para o diagnóstico precoce da dengue e outras doenças febris virais agudas, como a zika.”
Em cinco meses de realização da pesquisa, um total de 140 pacientes foi recrutado com cerca de 480 visitas à unidade de saúde - uma média de 3,5 por paciente. Um resultado considerado bom até o momento, mas que pode ser melhorado, de acordo com Tereza. “É um desafio, porque a gente tem que convencer cada paciente a aderir ao estudo e depois retornar várias outras vezes, até a coleta da última amostra, a da convalescença. Se não conseguimos, os dados do paciente ficam incompletos,” esclareceu. Por isso a escolha por uma UPA, pois ela atende à comunidade do entorno e facilita o retorno do paciente, para a sequência do estudo. A pesquisadora destaca também a importância do comprometimento dos profissionais da UPA de Paulista com os objetivos do projeto. Além de existir um grupo previamente capacitado de quatro enfermeiros e uma médica ligados diretamente à pesquisa, o trabalho vem sendo realizado com a colaboração das demais equipes de plantão.
O projeto, coordenado no Recife pela Fiocruz Pernambuco em parceria com o Instituto de Medicina Integral Professor Fernando Figueira (Imip), tem pesquisadores dos departamentos de Virologia e Terapia Experimental e da Parasitologia da Fiocruz no estado, além de profissionais técnicos capacitados para a pesquisa. “A estrutura montada até o momento, incluindo os profissionais comprometidos e o apoio logístico oferecido pelas instituições envolvidas e recursos disponibilizados, pode também ser considerada um diferencial para a execução exitosa do projeto”, observou Ernesto Marques.
Essa matéria foi originalmente publicada na edição nº 58 do Informe Fiocruz Pernambuco. Confira outros destaques do informe.