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29/09/2014

Fundação promove palestra com vencedor do Nobel de Química

Danielle Monteiro


Milhares de proteínas controlam os processos químicos no corpo humano e problemas com elas geralmente provocam doenças. Até o final dos anos 1990, enxergar esses processos e como eles ocorrem só era possível em tecidos não vivos. Porém, uma grande descoberta mudou essa orientação, chamando atenção de toda comunidade científica: a Proteína Verde Fluorescente (GFP, em inglês). A ferramenta, usada atualmente em todo mundo, possibilitou que cientistas enxergassem todo o trabalho interno de células, tecidos e organismos vivos, abrindo portas para novas perspectivas acerca da biologia. O autor da descoberta, que ganhou o Nobel de Química de 2008, ministrou palestra na sexta-feira (26/9) na Fiocruz. Durante o encontro, Chalfie falou sobre o uso da GFP em estudos científicos. “A Fiocruz tem uma tradição, missão e trabalho impressionantes. É uma instituição que tem forte atuação na aplicação de pesquisa básica com foco na saúde pública, o que acho extremamente importante. Estou muito feliz de estar aqui”, disse Chalfie ao iniciar a palestra.

O Prêmio Nobel Martin Chalfie, em sua conferência na Fiocruz (Foto: Peter Ilicciev)

 

Uma das ferramentas mais importantes na biociência contemporânea, a GFP é usada como marcador biológico na localização e rastreamento de células ou proteínas. Segundo Chlafie, a maior importância do uso da Proteína Verde Fluorescente é que, com ela, tornou-se possível observar todo o processo biológico na medida em que ele ocorre, o que possibilita uma compreensão mais ampla acerca de doenças e o estudo sobre possíveis tratamentos. Com a ajuda da GFP, pesquisadores podem, por exemplo, estudar os danos provocados pelo Alzheimer nas células nervosas, observar como se originam as células produtoras de insulina em um embrião e ainda enxergar a expansão de um vírus no organismo e como ocorre o processo de metástase usando a Proteína como marcador de células cancerígenas. “Com essa ferramenta, agora é possível saber como as células são destruídas e afetadas. Podemos, por exemplo, fazer a contagem e checar a porcentagem da perda de células. Tudo isso permite um melhor monitoramento do processo de enfermidades”, explicou. A descoberta da GFP, publicada na revista Science, já gerou, até então, mais de 150 mil artigos científicos.

Segundo Chalfie, além de permitir o estudo das células em organismos vivos, o uso da Proteína Verde Fluorescente tem outras grandes vantagens. “Sua utilização não fere o organismo e sua pequena dimensão se encaixa totalmente no interior das células, possibilitando uma visão panorâmica do que está sendo estudado”, destacou. A GFP pode ser usada em expressões genéticas, na localização de proteínas, na biotecnologia, em descobertas de medicamentos e no estudo de doenças como HIV, câncer e enfermidades genéticas e infecciosas. “Agora podemos enxergar muito do que, antes, não podíamos ver”, comentou o vencedor do Nobel.

Chalfie contou que não foi fácil chegar à descoberta. O primeiro cientista a isolar a GFP e descobrir qual parte da proteína era responsável por sua fluorescência foi o japonês Osamu Shimomura. Em 1960, Shimomura começou a estudar a bioluminescência da água viva Aequorea victoria. Ele descobriu que, para se iluminar, a Aequorea libera íons de cálcio, os quais se ligam a uma proteína que ele chamou de aequorin, que libera uma luz azul sobre a ligação de cálcio. A luz azul é absorvida pela Proteína Verde Fluorescente que, por sua vez, emite uma luz verde. Shimomura queria apenas compreender a química e bioquímica envolvidas na produção do brilho verde da água viva e nunca se interessou em aplicações da GFP como molécula de rastreamento. Foram os estudos de Martin Chalfie, juntamente com o bioquímico sino-americano Roger Tsien, que permitiram que bactérias emitissem uma luz verde com o uso da GFP, culminando, assim, no desenvolvimento da Proteína Verde Fluorescente como marcador biológico. “A descoberta da GFP é uma boa metáfora do ‘fazer’ ciência, pois ela nos mostra que a pesquisa básica é essencial, que descobertas podem ser acidentais, que a teimosia e perseverança podem ser de grande valia e que o progresso científico é cumulativo e requer a participação e  envolvimento de muitos”, concluiu Chalfie.

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