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21/11/2016

Especialistas indicam interdisciplinaridade para a Agenda 2030

André Costa (Agência Fiocruz de Notícias)


A necessidade de abordagens interdisciplinares e do envolvimento de diferentes segmentos da sociedade para o avanço da Agenda 2030 foram os principais pontos discutidos no segundo e último dia do Segundo Encontro de Think Tanks e Instituições Acadêmicas de Políticas de Saúde Global, promovido pela Fiocruz. Em sua conclusão, o encontro internacional que reuniu mais de 40 especialistas de várias partes do mundo e teve por tema Implementação dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável de Saúde: no caminho certo?, contou com uma mesa de discussão e dois grupos de trabalho, buscando identificar os desafios e as oportunidades da Agenda 2030, assim como quais podem ser as contribuições de think tanks e instituições acadêmicas para o sucesso da mesma.

Encontro internacional que reuniu mais de 40 especialistas de várias partes do mundo (foto: Pedro Linger)

 

A primeira participante do dia, a presidente da Comissão de Estatística das Nações Unidas e ex-presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) Wasmália Bivar, fez apresentação sobre indicadores necessários para o sucesso dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODSs). Os objetivos, afirmou, impõem a “construção de novos dados, não tradicionais e que estão para além da atual fronteira das estatísticas oficiais”. Segundo a economista, questões referentes ao meio ambiente e a alterações climáticas, por exemplo, muitas vezes não são contempladas pelos atuais indicadores, exigindo abordagem multidisciplinar. Para reverter este cenário, entre outras ações está a Elaboração do Plano de Ação Global, que será discutido no Fórum Mundial de Dados da ONU em janeiro de 2017 por governos, empresas, sociedade civil, a comunidade científica e acadêmica, especialistas públicos e privados, gestores de informação, produtores estatísticos, especialistas em sistemas de informação e usuários em geral.

A importância de abordagens interssetoriais foi aprofundada pelo expositor seguinte, o gerente da Área de Desenvolvimento Sustentável e Saúde Ambiental da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), Luiz Augusto Galvão. O desenvolvimento econômico inclusivo, a sustentabilidade ambiental, a paz e a segurança e o desenvolvimento social inclusivo se interrelacionam e interferem uns sobre os outros de modo intrínseco, defendeu Galvão; deste modo, iniciativas que promovam a produção sustentável de alimentos, o uso de energias sustentáveis, que gerem empregos sustentáveis e que previnam a exposição tóxica a químicos, por exemplo, são também questões de saúde pública, ao mesmo tempo que dizem respeito a diversos outros setores.

A diretora do Programa de Saúde Global do Instituto de Pós-Graduação para Estudos Internacionais e do Desenvolvimento de Genebra, Ilona Kickbusch, fez a apresentação seguinte, chamando a atenção a atenção para a necessidade de tornar os indicadores compreensíveis, para que assim possam ser politicamente relevantes. “Nenhum objetivo será alcançado sem decisões políticas, não importa qual indicador seja usado”, afirmou. Kickbusch acrescentou que o “único jeito de empurrar os líderes para fazer as coisas é chamando a atenção para o que estão fazendo bem e o que estão fazendo mal”. De acordo com ela, o método para fazer isso é tornar os dados ser acessíveis e compreensíveis não apenas para especialistas, mas para representantes governamentais, para o setor privado e para sociedade civil.

Primeiro grupo de trabalho se focou nos paradigmas e desafios a think tanks e universidades (foto: Pedro Linger)

 

Encerrada a mesa de discussão, o primeiro grupo de trabalho se focou nos paradigmas e desafios a think tanks e universidades. Suas recomendações incluíram que a definição dos papéis de think tanks e universidades fiquem bem delimitadas e claras, uma vez que são instituições de caráter distinto e que variam de acordo com as regiões globais e especificidades geográficas. A elaboração de um manual traduzindo o que são os ODSs para o público geral também foi considerada uma prioridade, de modo a traduzir as evidências científicas relacionadas aos objetivos em linguagem de fácil compreensão. Ademais, enfatizou-se a importância do estabelecimento de diretrizes para o diálogo como os formuladores de políticas públicas.

“Precisamos reconhecer que não podemos agir sozinhos, que precisamos compartilhar o conhecimento”, disse Ilona Kickbusch, relatora do grupo. Definiu-se que deve-se fazer um levantamento da pesquisa que já existe e dos vácuos que elas não cobrem. Uma redefinição dos papéis e das universidades também deve ser elaborada. O envolvimento das comunidades, de modo a fortalece-las, também deve ser uma prioridade.

O segundo grupo de trabalho concentrou-se na importância da pesquisa interdisciplinar para o desenvolvimento de abordagens e métodos que acelerem a implementação dos ODS. “Temos uma mensagem muito clara e ressonante de que é preciso ir além de abordagens tecnocráticas para avançar os ODSs”, disse seu relator, Felix Rozenberg, do Centro de Relações Internacionais em Saúde (Cris/Fiocruz). “Não podemos nos limitas às tarefas acadêmicas, às áreas clássicas de treinamento. Pelo contrário, precisamos desenvolver outros processos de empoderamento da sociedade, unindo atores de diferentes setores. Temos oportunidades para ações coletivas, diferentes modos de trabalho podem ser usados”, afirmou Rozenberg.

Segundo grupo de trabalho concentrou-se na importância da pesquisa interdisciplinar para o desenvolvimento de métodos que acelerem a implementação dos ODS (foto: Pedro Linger)

 

A história do enfrentamento à Aids e ao HIV, da defesa dos direitos reprodutivos das mulheres e da abordagem institucional sobre a saúde dos nativos no Peru foram exaltados como exemplos bem-sucedidos de abordagens interdisciplinares no passado recente. Dentre os desafios para que mais iniciativas como estas avancem, o grupo identificou, entre outros, o fato de que muitas vezes não se reconhece o trabalho de pesquisadores que provém de áreas distintas às áreas de conhecimento mais tradicionais, assim como o fato de que os modos de financiamento nem sempre priorizam abordagens interdisciplinares. Segundo o grupo, os ODSs, todavia, podem alterar este cenário, por serem “uma imensa oportunidade para compartilhar conhecimento e experiência, para identificar quais são os modos que estão ajudando a gerar conhecimento e a avalia-los”.

Fiocruz e o comprometimento com a Agenda 2030

Nas considerações finais do evento, Ilona Kickbuschh observou que, ao longo dos dias, reforçou-se a ideia de que os ODSs são um quebra-cabeças que deve ser unido. Kickbusch destacou que a pesquisa constitui um elemento deste quebra-se cabeças, e afirmou que as recomendações dos dias de discussão serão levadas para reuniões futuras sobre os papéis de think tanks e instituições acadêmicas para a implementação dos ODSs.

Ilona Kickbuschh, diretora do Programa de Saúde Global do Instituto de Pós-Graduação para Estudos Internacionais e do Desenvolvimento de Genebra, e Paulo Buss, coordenador do Centro de Relações Internacionais em Saúde da Fiocruz (foto: Pedro Linger)

 

Pete destacou que reuniões como a desta semana já estavam marcadas para a América do Norte e para o sudeste da Ásia, e que os resultados dos dois dias de discussão seriam levados até elas. “Temos uma agenda muito, muito grande, a desenvolver. Encorajamos a todos a ajudar a identificar de onde as oportunidades podem vir”, afirmou o diretor associado da Iniciativa Think Tanks do Centro de Pesquisas para o Desenvolvimento Internacional (CRDI), Peter Taylor. “Nossas discussões não foram sobre criar mais uma rede, mas sobre nos comprometer com uma agenda transformativa. A ação coletiva e a mobilização também são uma forma de ajudar, e espero que possamos fazer isso de diferentes formas, em blogs, periódicos médicos, jornais e outras formas.”

O coordenador do Centro de Relações Internacionais em Saúde (Cris/Fiocruz), Paulo Buss, por sua vez, agradeceu a participação de todos, e afirmou que o resultado da reunião possivelmente dará origem a um artigo a ser publicado no British Medical Journal. Além disso, Buss disse que o resultado desta reunião será levado a reuniões futuras, e reforçou o compromisso da Fiocruz com a Agenda 2030.

“A Fiocruz está envolvida até o pescoço para motivar o governo brasileiro a adotar a Agenda 2030. Faremos todo esforço para que a agenda do desenvolvimento receba influência da Fundação, levando nossas propostas. Compartilhamos aqui o voto para que cada um dos think tanks e instituições acadêmicas façam o mesmo”, afirmou.

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