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09/03/2021

Nova Radis destaca chegada da vacina e desafios da pandemia

Ana Cláudia Peres e Luiz Felipe Stevanim (Revista Radis)


Mesmo de máscara, no supermercado ou no elevador, ela é reconhecida como “a doutora da Fiocruz”. Não é para menos: desde o início da pandemia de Covid-19, a médica pneumologista Margareth Dalcolmo, da Fiocruz, tornou-se um dos rostos mais frequentes na mídia como uma das porta-vozes da ciência, em um esforço incansável para levar orientações e informações confiáveis para a população. Contudo, ela afirma que a empreitada assumida por ela e outros cientistas é uma luta “desigual de Davi contra Golias”, principalmente quando autoridades públicas adotam falas que deseducam a população ou recomendam medicamentos sem eficácia comprovada para o tratamento do novo coronavírus. “Mesmo que a gente esteja com o luto absolutamente indissociável do nosso dia a dia, carregando nas costas 210 mil mortes, as autoridades continuam dizendo que o problema está resolvido”, aponta.

Com décadas de experiência na saúde pública, a médica não tem dúvidas em afirmar que “a vacina é a única e perfeita solução de controle de uma epidemia do porte da Covid-19”. Fundadora do ambulatório do Centro de Referência Professor Hélio Fraga, da Fiocruz, Margareth é uma das coordenadoras principais do estudo internacional de fase 3 que avalia o uso da vacina BCG para reduzir o impacto do novo coronavírus. “O Brasil, tradicionalmente, sabe vacinar. Nós sabemos fazer campanha e podemos vacinar milhões de brasileiros num único dia para a Covid-19, se nós quisermos”, afirma, em referência ao reconhecimento internacional do Programa Nacional de Imunizações (PNI).

Quando conversou com Radis, faltavam quatro dias para a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) liberar duas vacinas para uso emergencial no Brasil: a Coronavac, fabricada pelo Instituto Butantan, em parceria com a empresa Sinovac; e o imunizante da AstraZeneca/Oxford, a ser produzido no país pela Fiocruz. Depois da liberação da Anvisa, em 17/1, uma avalanche de acontecimentos tomou os noticiários: o início imediato da campanha de vacinação, por pressão dos governadores, foi sucedido pelas notícias de atraso no envio de 2 milhões de doses compradas na Índia e dos insumos necessários para produzir tanto a vacina do Butantan quanto a da Fiocruz, o que comprometeria a estratégia de imunizar a população. Em vídeo que viralizou na internet diante desses fatos, Margareth afirmou que “é absolutamente injustificável” que um país como o Brasil não tenha as vacinas disponíveis para a sua população. Em nossa conversa, ela já destacava que erros na negociação e falta de ação poderiam prejudicar a estratégia brasileira de imunização, que conta a seu favor com a experiência do SUS.

Como cientista, Margareth afirma que tem um compromisso cívico “inarredável” de orientar a população. Para ela, ciência “não é uma abstração”, mas algo concreto, que impacta a vida das pessoas, feita por gente de carne e osso. “Sobretudo num país desigual como o Brasil, ela exige que nós todos, médicos, pesquisadores, cientistas, sejamos cidadãos muito engajados pelo bem comum”, ressalta. Isso também exige a capacidade de dizer que não sabe: “A gente não pode chutar”. A médica faz duras críticas à coação do Ministério da Saúde, em ofício de 7/1, para que médicos de Manaus receitassem o chamado “kit covid” ou “tratamento precoce”, com medicamentos sem eficácia comprovada.

Para ela, a Covid-19 foi “um fenômeno modificador de nossas vidas”. Ou, como costuma dizer, “um divisor de águas”. Ela afirma que gostaria de estar errada em suas previsões, mas não foi assim ao considerar que teríamos “o janeiro mais triste de nossas vidas”. “Teremos um ano de 2021 ainda muito difícil e, nos próximos dois anos, o mundo todo terá que guardar alguns cuidados coletivos de proteção”, pontua. Antes de iniciar a entrevista, Margareth foi interrompida por mensagens do serviço de saúde que coordena: “Tá um inferno minha vida, gente”, brincou. Dez minutos depois de falar com Radis, ela seguiria a maratona com outra entrevista para o jornal “Der Spiegel”, da Alemanha. Contudo, a médica revela que tem o ânimo renovado por “uma quantidade tão grande de estímulos e de mensagens tão extraordinariamente confiantes”. “Eu me sinto diante de um compromisso, de uma missão, e não me furtarei a ela, de modo algum”, resume.

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