22/10/2024
Ana Paula Blower e Pamela Lang (Agência Fiocruz de Notícias)
O fortalecimento da ciência e do trabalho conjunto para enfrentar desafios de saúde e em prol da equidade no acesso foi o mote principal das falas desta segunda-feira (21/10) na cerimônia de abertura da Reunião Anual da Rede Pasteur 2024 (PNAM 2024, na sigla em inglês). Com coorganização da Fiocruz, o encontro vai até quinta-feira (24/10), no Rio de Janeiro, e tem entre os objetivos o compartilhamento de informações entre os membros da Rede. Os discursos de abertura, como os da ministra da Saúde do Brasil, do presidente da Fiocruz e do presidente da Rede Pasteur, destacaram a importância da cooperação para futuras crises, de se investir nas futuras gerações de cientistas e da disseminação do conhecimento.
O microbiologista Peter Piot, a diretora-executiva da Rede Pasteur, Rebecca Grais, o presidente da Rede Pasteur e administrador-geral do Institut Pasteur de Dakar, Amadou Sall, a vice-presidente da Rede e presidente do Institut Pasteur, Yasmine Belkaid, o pesquisador Manoel Barral e o presidente da Fiocruz, Mario Moreira, na abertura do evento (Foto: Peter Ilicciev)
Em um vídeo, a ministra da Saúde, Nísia Trindade Lima, saudou os participantes e enfatizou a importância da reunião ser realizada pela primeira vez nas Américas e de ter a Fiocruz como co-anfitrião. A ministra ressaltou sua satisfação com a agenda do evento, que discutirá, segundo ela, temas cruciais para a pasta: o impacto das mudanças climáticas na transmissão de doenças e o acesso equitativo às vacinas. “Neste momento o Brasil reconstrói seu Sistema Único de Saúde e reafirma a importância das evidências científicas e do trabalho articulado com a comunidade de ciências no país e no mundo. Quero celebrar este evento e colocar o compromisso do Ministério com o debate e a implementação de importantes questões que virão desta reunião”, afirmou.
Em sua fala, o presidente da Fiocruz, Mario Moreira, lembrou os últimos eventos internacionais sediados pela Fundação, como a reunião dos Institutos Nacionais de Saúde e a Cúpula de Preparação para Pandemias, ressaltando o momento que o mundo vive diante da necessidade de se pensar acesso equitativo à saúde. “Espero que tenhamos aprendido na pandemia, quando esforços mundiais não tiveram êxito, visto que, em determinado ponto, 25% da população mundial havia adquirido 75% das vacinas disponíveis”, disse Moreira. “E é disso que se trata essa sequência de eventos que estamos recebendo no Brasil - teremos em breve a reunião do G20 -, o que ordena os valores dessas reuniões é termos um mundo mais equilibrado, com acesso à saúde, e esse acesso passa por ter uma ciência mais equilibrada”.
Mario Moreira: 'o que ordena os valores dessas reuniões é termos um mundo mais equilibrado, com acesso à saúde, e esse acesso passa por ter uma ciência mais equilibrada' (Foto: Peter Ilicciev)
Moreira destacou o papel da Rede Pasteur na produção de conhecimento, na formação de pesquisadores e de lideranças científicas: “Um mundo melhor passa por isto e estamos plenamente alinhados e juntos neste esforço. Desejo que este seja um evento científico, mas também de reafirmação política para um mundo melhor, para que todos, do Norte e do Sul globais, possam ter acesso à uma boa ciência e à saúde para seus povos”.
O presidente da Rede Pasteur e administrador-geral do Institut Pasteur de Dakar, Amadou Sall, destacou a liderança da Fundação e afirmou que “a Fiocruz é um dos membros mais renomados da Rede” e que tem sido um “protagonista importante em saúde global por mais de 100 anos, como um resultado do esforço pioneiro de Oswaldo Cruz”. Sall ressaltou ainda o trabalho do Pasteur Dakar como uma luz para a excelência em saúde na África. “À medida que celebramos as conquistas de Oswaldo Cruz e dos institutos Pasteur, devemos também confrontar os desafios futuros; o mundo enfrenta crises sanitárias e os impactos são grandes. O desafio necessita de coordenação rápida a nível internacional e de vigilância constante”.
Sall chamou atenção ainda para os efeitos destrutivos das mudanças climáticas e saudou os avanços possibilitados pela tecnologia e inovação em termos de preparação para pandemias. Por fim, afirmou que o Brasil está bem posicionado na presidência do G20 para liderar as discussões sobre acesso a vacinas e o fortalecimento dos sistemas de saúde. “Este é um momento crítico para contribuirmos para moldar a agenda global e garantir que pessoas e populações vulneráveis não sejam deixadas para trás”, concluiu.
Amadou Sall: 'o mundo enfrenta crises sanitárias e os impactos são grandes. O desafio necessita de coordenação rápida a nível internacional e de vigilância constante' (Foto: Peter Ilicciev)
Futuras gerações de cientistas
A diretora-executiva da Rede Pasteur, Rebecca Grais, foi a anfitriã da cerimônia. Ela fez uma reflexão sobre momentos da história em que o progresso foi “sufocado”, lembrando a história do médico brasileiro Hilário de Gouveia, cujo trabalho ajudou a entender as bases genéticas do retinoblastoma décadas depois, mas que não teve reconhecimento por barreiras linguísticas. “A história de Gouveia é um lembrete de que a ciência não existe num vácuo, o conhecimento deve ser compartilhado, disseminado livremente para além de fronteiras e idiomas, para o benefício da Humanidade”, afirmou ela. “Na Rede temos muitos Hilários e, talvez, nosso maior desafio coletivo enquanto rede seja ajudá-los para garantir que tenham um futuro diferente”.
Em sua primeira reunião anual, a vice-presidente da Rede e presidente do Institut Pasteur, Yasmine Belkaid, também falou sobre a importância de investir nas próximas gerações de cientistas. Ela reforçou seu compromisso em prol de uma rede colaborativa: “Os desafios que enfrentamos são grandes demais para enfrentarmos sozinhos”, disse Belkaid. “Precisamos promover a pesquisa para todos e garantir o crescimento de novos líderes científicos, O futuro da ciência depende da próxima geração de cientistas”.
Yasmine Belkaid: 'os desafios que enfrentamos são grandes demais para enfrentarmos sozinhos' (Foto: Peter Ilicciev)
Com foco justamente no incentivo ao trabalho de jovens pesquisadores, foi entregue durante a cerimônia o Talent Awards. Este ano marca a primeira edição do prêmio dedicada à Ciência e à Comunicação, que foi para a pesquisadora assistente do Instituto Pasteur de Bagui, na República Centro-Africana, Claire Sangba-Kembi Ngounou, que tem uma pesquisa sobre o comportamento da mordida do mosquito e a resistência ao inseticida. Claire receberá 20 mil euros para apoiar o plano de comunicação de um projeto de conscientização sobre a malária.
A pesquisadora Claire Sangba-Kembi Ngounou (à esquerda), da República Centro-Africana, recebeu o Talent Awards (Foto: Peter Ilicciev)
Reunião do Conselho de Diretores da Rede Pasteur
Na manhã de ontem (21/10), a Fiocruz sediou a reunião do Conselho de Diretores da Rede Pasteur. Durante o encontro, os membros debateram estratégias para o fortalecimento da Rede junto a organismos internacionais, orçamento para o próximo ano e novos desafios.
Para o presidente do Instituto Pasteur de Dakar e da Rede Pasteur, Amadou Sall, a Rede Pasteur é uma plataforma global e como tal, deve buscar novas formas de impactar os tomadores de decisão no campo da saúde.
“Pensar num nível estratégico é extremamente importante. A ciência é a base dos institutos que compõem a Rede, mas precisamos expandir nosso papel político”, acrescentou o presidente da Fiocruz, Mario Moreira.
Além dos desafios políticos, os diretores pontuaram a necessidade de ampliar as estratégias de comunicação para que os institutos-membro possam ser melhor reconhecidos pelo papel local que desempenham em suas regiões e países e não como parte do Instituto Pasteur de Paris. Após a reunião, o Conselho fez uma visita a alguns espaços da Fundação, incluindo o Castelo Mourisco.