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21/05/2018

Castelo da Fundação Oswaldo Cruz completa 100 anos

César Guerra Chevrand (COC/Fiocruz)


O maior símbolo da Fundação Oswaldo Cruz está completando 100 anos em 2018. Idealizado pelo próprio cientista Oswaldo Cruz, que desenhou seus primeiros esboços, e projetado pelo arquiteto português Luiz Moraes Júnior, o Castelo Mourisco chega ao seu centenário tendo cumprido a missão desejada pelo patrono da Fiocruz, de ser o ícone do desenvolvimento da ciência e da saúde pública no Brasil.

O Castelo Mourisco, maior símbolo da Fiocruz, está completando 100 anos em 2018 (foto: Ana Limp)

 

Para a presidente da Fiocruz, Nísia Trindade Lima, além de ser um símbolo da ciência brasileira, o Pavilhão Mourisco é um monumento para expressar o caráter permanente que deve ter a atividade de pesquisa voltada para a resolução dos problemas de saúde. “O Castelo é um símbolo da maior importância contemporânea, quando afirmamos que os recursos aplicados em ciência, tecnologia e inovação não devem ser vistos como gasto e sim como investimento no futuro do país como nação autônoma e inclusiva. É também um símbolo reconhecido pelos diferentes países com os quais a Fiocruz estabelece cooperação; um símbolo de uma ciência voltada para a saúde global, a justiça e a paz”, afirma Nísia. 

“Por sua arquitetura singular, nos convida a uma reflexão sobre as relações entre arte, cultura e ciência, um encontro que enriquece a experiência de todos os que trabalham ou estudam na instituição, em suas diversas sedes no Rio de Janeiro e em outras cidades brasileiras, e de todos que levam consigo um pouco dela, seja por meio de resultados de pesquisa, cursos, vacinas, serviços, enfim, um pouco deste rico mosaico chamado Fiocruz”, completa a presidente.

“O Castelo Mourisco representa o êxito da ciência brasileira" (foto: Peter Ilicciev)

 

Diretor da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz), unidade técnico-científica responsável pela preservação e da restauração do patrimônio arquitetônico, ambiental e urbanístico da Fundação, Paulo Elian reafirma a importância do monumento. “O Castelo Mourisco é o maior símbolo da Fiocruz e representa o êxito da ciência brasileira, desta instituição científica centenária e reconhecida por suas grandes contribuições para o país. A comunidade da Fiocruz e a sociedade reconhecem esse símbolo, seu valor científico e cultural. Nós da Casa temos sobre esse patrimônio enorme responsabilidade na sua preservação, pesquisa e uso social”, destaca.

Palácio das Ciências

Construído entre 1905 e 1918, o Pavilhão Mourisco foi erguido em uma colina na antiga fazenda de Manguinhos, de frente para a Baía de Guanabara, para substituir as antigas e improvisadas instalações do Instituto Soroterápico Federal, criado em 25 de maio de 1900. Principal edificação do Núcleo Arquitetônico Histórico (NAHM) de Manguinhos – também composto hoje pelo prédio do Quinino ou Pavilhão Figueiredo Vasconcellos, Cavalariça, Pavilhão do Relógio ou da Peste, Pombal ou Biotério para Pequenos Animais, Hospital Evandro Chagas e a Casa de Chá  – o “Palácio das Ciências” foi imaginado por Oswaldo Cruz para ser a sede do novo instituto, criado à imagem do Instituto Pasteur, de Paris, reunindo a produção de vacinas e remédios, a pesquisa científica e demais atividades ligadas à saúde pública.

Construído entre 1905 e 1918, o Pavilhão Mourisco foi erguido em uma colina na antiga fazenda de Manguinhos (foto: Acervo COC/Fiocruz)

 

“A ideia era marcar a gestão dele à frente da Saúde Pública e a própria presença da Saúde Pública nas ações do Brasil novo, republicano, com um Palácio das Ciências. Uma edificação suntuosa, não pelo luxo, mas pela sua expressão. Uma construção sólida e monumental para ser importante e durar no tempo”, afirma o arquiteto, urbanista e pesquisador do Departamento de Patrimônio Histórico (DPH) da Casa de Oswaldo Cruz, Renato Gama-Rosa, coordenador do Programa de Pós-Graduação em Preservação e Gestão do Patrimônio Cultural das Ciências e da Saúde da COC.

De acordo com Renato Gama-Rosa, o estilo eclético que define o Pavilhão Mourisco teve três influências principais, ao longo de seus anos de construção. A primeira foi o Palácio de Montsouris, em Paris, que Oswaldo Cruz conheceu quando estudou na França. Ali já estava marcada a presença da linguagem neo-mourisca, que vivia um momento de valorização no final do século 19 na Europa. A segunda influência foi justamente o Castelo de Alhambra, em Granada, Espanha. “Na biblioteca particular de Oswaldo Cruz tem um livro sobre a Alhambra, que ele comprou e provavelmente mostrou ao Luiz Moraes Jr. O arquiteto copiou os seus desenhos. Depois do livro de Alhambra, as obras do Castelo ganharam outra dimensão”, explica Renato.

A terceira principal influência, revelada mais recentemente, foi a sinagoga de Berlim, que inspirou outras sinagogas mundo afora e também as torres do Castelo do então Instituto Oswaldo Cruz. “As torres do Castelo são cópias fiéis das torres dessas sinagogas”, diz Renato. Entre outras influências, Renato também destaca a presença da arquitetura de saúde da época. “As construções de saúde dessa época obedeciam à planta em formato H para permitir a ventilação cruzada dos ambientes”.

A construção

Para a construção do Pavilhão Mourisco foram utilizados vidros, telhas, revestimentos, mármores, ferros e luminárias importados da Europa. A maior parte do material chegava de barco, por meio de um cais instalado na Baía de Guanabara, cujas águas chegavam até onde hoje está a Avenida Brasil, inaugurada apenas em 1947. Ainda na primeira década do século 20, o primeiro e o segundo pavimentos do Pavilhão Mourisco foram ocupados por laboratórios, enquanto seguiam as obras nos pavimentos superiores.

Escadaria interna do Castelo Mourisco que leva ao segundo pavimento (foto: Peter Ilicciev)

 

O terceiro, quarto e quinto pavimentos do Castelo, incluindo seu terraço e suas torres, foram finalizados a partir de 1910. Em 1918, o museu e a biblioteca já estavam funcionando no terceiro andar e os trabalhos de ornamentação do hall e do salão nobre da biblioteca foram concluídos. Os equipamentos de laboratório e as instalações elétricas, térmicas, telefônicas e telegráficas também já haviam sido implementadas, caracterizando o Pavilhão Mourisco como um dos edifícios de maior sofisticação tecnológica do país, incluindo um elevador que funciona até os dias de hoje.

O terraço e as torres do Castelo Mourisco foram finalizados a partir de 1910 (foto: Peter Ilicciev)

 

“O fato de o Instituto Oswaldo Cruz ter uma sede tão robusta e tão sólida ajudou na própria perenidade da instituição, com impacto para o desenvolvimento da ciência e da saúde no país. Se não houvesse uma obra de maior vulto nas antigas instalações da fazenda de Manguinhos, talvez a instituição não tivesse tido o progresso que teve. Era como se desde o início o Castelo simbolizasse a instituição”, comenta Renato Gama-Rosa.

Usos e conservação

Morto precocemente em 11 de fevereiro de 1917, Oswaldo Cruz não conseguiu ver o seu projeto concluído, mas o sonho de um “Palácio das Ciências” permaneceu vivo para as próximas gerações. O Núcleo Arquitetônico Histórico de Manguinhos foi tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico em 1981. Desde a criação da Casa de Oswaldo Cruz (COC/Fiocruz), em 1986, o patrimônio histórico e cultural da Fiocruz está sob a sua guarda e responsabilidade. Segundo o arquiteto e pesquisador do Departamento de Patrimônio Histórico (DPH) da Casa de Oswaldo Cruz, a solidez do Castelo contribuiu para que não fossem necessárias muitas obras de manutenção ao longo dos anos. O maior esforço foi justamente para rever algumas reformas que descaracterizaram o projeto original.

“As maiores intervenções foram feitas para descaracterizá-lo internamente, no período dos militares, nos anos 1970. Quando a Casa de Oswaldo Cruz surgiu foi para desfazer uma série de intervenções mal feitas pelos militares na parte interna do Castelo, como fechamento de portas e vãos”, afirma Renato, que aponta os terraços e as torres como as áreas mais frágeis do Pavilhão Mourisco.

Atualmente, o Castelo Mourisco é ocupado pela Presidência da Fiocruz e seus setores administrativos, pelo Departamento de Patrimônio Histórico (DPH) da COC e pelo Instituto Oswaldo Cruz, unidade técnico-científica da Fiocruz. Além disso, o Castelo também abriga a Biblioteca de Obras Raras (imagem), sob a guarda do Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnologia em Saúde (Icict/Fiocruz), e três salas de memórias, em homenagem aos cientistas Oswaldo Cruz, Carlos Chagas e Costa Lima, que fazem parte do roteiro de visitação do Museu da Vida em Manguinhos. “São alguns usos que a gente fez questão de preservar. Tem que ter usos simbólicos, mas compatíveis com um monumento centenário deste porte”, diz Renato. (foto: Ana Limp)

Para manter os setores em funcionamento, com dezenas de pessoas ocupando diariamente o Pavilhão Mourisco, a Casa de Oswaldo Cruz investiu, desde a sua criação, no setor de Educação Patrimonial. O objetivo era incentivar os trabalhadores da Fiocruz a respeitar o patrimônio da instituição.  “O nosso desafio, desde a criação da Casa de Oswaldo Cruz, é justamente conciliar o uso com a questão patrimonial. Por um lado o uso ajuda na conservação e na manutenção do edifício, mas por outro lado impõe uma série de medidas que não afetem os seus materiais originais. A gente teve que adotar o ar condicionado, por exemplo, para permitir o uso e o conforto de quem trabalha no Castelo. A gente faz um planejamento para que o uso seja possível, com o menor impacto possível”, explica Renato.

25/5/2018.

 

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