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16/09/2016

Pesquisa analisa relação entre cultivo de tabaco e suicídio

Tatiane Vargas (Ensp/Fiocruz)


A Fiocruz, em ação conjunta com o Centro de Valorização da Vida (CVV), está mobilizada na campanha Setembro Amarelo, que busca valorizar a vida e chamar a atenção para o suicídio, atualmente responsável por 32 mortes por dia no Brasil. Simbolizado a ação, o Castelo de Manguinhos ficará iluminado na cor amarela durante todo o mês de setembro (Confira o Especial Suicídio da Agência Fiocruz de Notícias). De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), cerca de 800 mil pessoas tiram a própria vida por ano em todo o mundo. No Brasil, muitas causas são atribuídas ao suicídio, e algumas regiões apresentam número elevado de casos. A fim de relacionar condições de vida, trabalho e saúde, Vera Borges, da Divisão de Controle do Tabagismo do Instituto Nacional do Câncer (Inca), defendeu a dissertação de mestrado em Saúde Pública na Escola Nacional de Saúde Pública (Ensp/Fiocruz), a qual analisou o processo de trabalho relacionado ao cultivo de tabaco, identificando elementos associados aos casos de suicídios em municípios produtores de tabaco nas regiões Sul e Nordeste do Brasil. A pesquisa aponta a necessidade de aprofundamento de pesquisas sobre suicídio na área agrícola, buscando ampliar o entendimento do tema, além de providências de várias áreas ligadas à saúde do trabalhador.

Segundo Vera, o tema suicídio e transtornos mentais entre trabalhadores rurais - especialmente na produção de fumo - é real, porém silencioso, o que a motivou querer conhecer mais sobre essa vertente. Para ela, a ideia é que os resultados da pesquisa contribuam em ações de intervenção no campo da saúde do trabalhador e na política de controle de tabaco no país. No Brasil, o cultivo de tabaco existe há cerca de 120 anos, e aproximadamente 200 mil famílias estão envolvidas em sua produção, sendo a maioria delas de pequenos agricultores familiares que arrendam ou possuem pequenas áreas de terra e têm o fumo como a principal, ou única, fonte de renda da família. A Região Sul é a que possui maior concentração de plantio de fumo, responsável por quase 96,8% da produção de tabaco no país. A Região Nordeste vem logo atrás, respondendo por 3,1% da produção, sendo a maior parte do tabaco produzido no local consumida no Brasil.

De acordo com a autora, o estudo orientado pelo pesquisador do Centro de Estudos da Saúde do Trabalhador e Ecologia Humana (Cesteh/Ensp), Frederico Peres, foi divido em duas etapas. Na primeira, foi analisado o processo de trabalho na produção de fumo; e, na segunda, as ocorrências dos suicídios em 52 municípios produtores de fumo e em outros 52 não produtores de fumo. Os estados que participaram da pesquisa foram: Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná (Região Sul) e Alagoas, Bahia e Sergipe (Região Nordeste). “Na etapa de análise do processo de trabalho, levou-se em consideração todas as etapas da produção do fumo pelo agricultor e sua família, os insumos necessários, as horas de trabalho e outros aspectos. Dessa forma, identificamos que, nesse tipo de atividade, existe uma série de riscos aos quais os trabalhadores estão expostos que podem comprometer significativamente sua saúde física e mental”, afirmou ela. Na segunda etapa, foram levantados dados sociodemográficos dos bancos de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DataSUS).

“Foram coletados dados dos maiores municípios produtores de fumo em Alagoas, Sergipe, Bahia, Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná. Tal procedimento foi adotado também com 52 municípios não fumicultores dos mesmos estados que possuíam similaridades sociodemográficas com os municípios fumicultores. O resultado mostrou que, de 2004 a 2013, houve o total de 1.247 registros de suicídios nos municípios fumicultores e 837 registros nos municípios não fumicultores no mesmo período. Os resultados dessa pesquisa apontam contribuições fundamentais para os artigos 17, 18 e 20 da Convenção Quadro para Controle do Tabaco (CQCT), que prevê atenção ao cultivo do tabaco, proteção à saúde e ao meio ambiente, além de pesquisa, vigilância e intercâmbio de informação”, destacou.

Segundo Vera, compreendendo todo o levantamento realizado na pesquisa, há, de fato, números que comprovam haver suicídios em áreas produtoras de fumo, e são necessárias investigações mais aprofundadas. “Esses números provocam impactos em vários níveis na sociedade e devem ser encarados como alarmantes, pois se trata de vidas humanas perdidas como resultado de um ato que poderia ter sido evitado. Qualquer número de suicídio é considerado elevado. Um único suicídio, em uma comunidade de trabalhadores agrícolas, obriga-nos a refletir sobre a repercussão desse episódio na vida da vítima e de todos ao redor. Qualquer que seja o número encontrado de suicídio em municípios que têm a fumicultura, ou não, como uma de suas características, denuncia demandas por ações de cuidados à população”, concluiu Vera Borges.

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